As Pessoas E As Coisas

Qual a relação existente entre pessoas e coisas? E de que forma o corpo é capaz de transformar essa relação? É o que busca responder As Pessoas E As Coisas.

No poema Popol Vuh, escrito em língua maia em meados do século 16, objetos domésticos como potes, pilões e grelhas, os quais foram maltratados por insensíveis homens de madeira, se revoltam contra seus donos e os atacam sem piedade, numa passagem que fala do rompimento do pacto entre as pessoas e as coisas.

Se a literatura ameríndia mostra como seres humanos e objetos deveriam idealmente interagir e se integrar, a cultura ocidental parece organizar a experiência humana de outro modo, postulando a divisão e declarando que as coisas são o contrário das pessoas, ainda que as pessoas tendam também a ser coisas, ou seja, escravas e objetos de quem lhe é hierarquicamente superior.

Mas esse princípio está em crise, como discorre com erudição e clareza o filósofo italiano Roberto Espósito, autor do breve ensaio As Pessoas E As Coisas.

Dividido em três capítulos, é no último deles, intitulado Corpos, que o filósofo destaca a situação contemporânea.

Ele se vale, no primeiro capítulo, do direito romano para definir o estatuto daquele que possui coisas, as quais são tácitos escravos a serviço de seus donos, e, no segundo capítulo, do discurso filosófico, para avaliar até que ponto a linguagem tende a anular a coisa, reduzindo-a à abstração.

A discussão sobre o corpo começa no terceiro capítulo, a partir do embrião humano. “Desde quando, e até quando, ele pode ser considerado uma pessoa, ao invés de uma coisa?”, se pergunta Esposito, para enveredar em seguida por nova especulação, que envolve também o morto: “A subtração de cadáver ou de embrião deve ser considerada da mesma maneira que um sequestro, como se se tratasse de uma pessoa, ou de um roubo, como se fosse uma coisa?”

Ao propor compreender a sociedade contemporânea pelo ângulo de visão do corpo, Esposito afirma que a antiga divisão entre pessoas e coisas não se sustenta mais, já que o corpo não é classificável nem como pessoa nem como coisa.

“O corpo é o terreno no qual as forças dos homens se enfrentam em uma luta sem trégua”, lemos na parte mais instigante do ensaio, “e o que está em jogo é a própria definição do que somos”.

Para mostrar a relevância filosófica do corpo, o autor cita, entre outros, Husserl e Merleau-Ponty, autores para os quais o corpo liga o objeto à consciência. “Somente o corpo”, conclui Esposito, dialogando também com filósofos contemporâneos como Jean-Luc Nancy, Peter Sloterdijk e Bruno Latour, “é capaz de preencher o hiato que dois milênios de direito, teologia e filosofia cavaram entre coisas e pessoas, colocando umas nas disponibilidades das outras”.

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Qual a relação existente entre pessoas e coisas? E de que forma o corpo é capaz de transformar essa relação? É o que busca responder As Pessoas E As Coisas.

No poema Popol Vuh, escrito em língua maia em meados do século 16, objetos domésticos como potes, pilões e grelhas, os quais foram maltratados por insensíveis homens de madeira, se revoltam contra seus donos e os atacam sem piedade, numa passagem que fala do rompimento do pacto entre as pessoas e as coisas.

Se a literatura ameríndia mostra como seres humanos e objetos deveriam idealmente interagir e se integrar, a cultura ocidental parece organizar a experiência humana de outro modo, postulando a divisão e declarando que as coisas são o contrário das pessoas, ainda que as pessoas tendam também a ser coisas, ou seja, escravas e objetos de quem lhe é hierarquicamente superior.

Mas esse princípio está em crise, como discorre com erudição e clareza o filósofo italiano Roberto Espósito, autor do breve ensaio As Pessoas E As Coisas.

Dividido em três capítulos, é no último deles, intitulado Corpos, que o filósofo destaca a situação contemporânea.

Ele se vale, no primeiro capítulo, do direito romano para definir o estatuto daquele que possui coisas, as quais são tácitos escravos a serviço de seus donos, e, no segundo capítulo, do discurso filosófico, para avaliar até que ponto a linguagem tende a anular a coisa, reduzindo-a à abstração.

A discussão sobre o corpo começa no terceiro capítulo, a partir do embrião humano. “Desde quando, e até quando, ele pode ser considerado uma pessoa, ao invés de uma coisa?”, se pergunta Esposito, para enveredar em seguida por nova especulação, que envolve também o morto: “A subtração de cadáver ou de embrião deve ser considerada da mesma maneira que um sequestro, como se se tratasse de uma pessoa, ou de um roubo, como se fosse uma coisa?”

Ao propor compreender a sociedade contemporânea pelo ângulo de visão do corpo, Esposito afirma que a antiga divisão entre pessoas e coisas não se sustenta mais, já que o corpo não é classificável nem como pessoa nem como coisa.

“O corpo é o terreno no qual as forças dos homens se enfrentam em uma luta sem trégua”, lemos na parte mais instigante do ensaio, “e o que está em jogo é a própria definição do que somos”.

Para mostrar a relevância filosófica do corpo, o autor cita, entre outros, Husserl e Merleau-Ponty, autores para os quais o corpo liga o objeto à consciência. “Somente o corpo”, conclui Esposito, dialogando também com filósofos contemporâneos como Jean-Luc Nancy, Peter Sloterdijk e Bruno Latour, “é capaz de preencher o hiato que dois milênios de direito, teologia e filosofia cavaram entre coisas e pessoas, colocando umas nas disponibilidades das outras”.

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