Alimentar A Cidade: Das Vendedoras De Rua À Reforma Liberal (Salvador, 1780-1860)

Nenhuma cidade alimenta a si mesma. Diferentemente da aldeia ou da vila, uma cidade depende de uma grande quantidade de gente de fora para plantar ou cultivar alimentos, e sobretudo para transportá-los, e de intermediários para comprá-los e revendê-los aos consumidores.

Salvador era uma grande cidade nas Américas do fim do século XVIII. Isso nos estimula a investigar não apenas essa malha de relações comerciais, mas também o que seu funcionamento revela sobre a composição social da cidade. Vendedores ambulantes, barqueiros, merceeiros, açougueiros, negociantes de gado, importadores; homens e mulheres; negros, mulatos e brancos; escravos, ex-escravos e livres — são esses os atores. Suas ações ajudaram a forjar a cidade, e seus negócios põem em relevo sua ordem social, seus costumes, suas ideologias e seus conflitos.
Salvador pertencia essencialmente ao mundo atlântico, onde a Europa se encontrava com a África nas Américas. Sua enorme baía faz dela um dos poucos grandes portos do Atlântico Sul. Das ricas terras produtoras de açúcar, tabaco e alimentos em volta da baía — coletivamente chamadas de Recôncavo — vinham os produtos que alimentavam a gente local e eram trocados por uma grande variedade de artigos importados no movimentado centro da cidade. Europeus, africanos, e gente de origem europeia e africana, além de alguns índios, se encontravam em Salvador, estabelecendo vínculos complexos e, simultaneamente, redefinindo as fronteiras que os separavam. Instituições de governo desenvolvidas na Europa foram aplicadas ali a uma população diversa e reformuladas para se adaptarem a um lugar que devia parecer exótico para seus administradores portugueses. Pessoas criadas inteiramente no Brasil argumentavam a favor ou contra princípios econômicos ou doutrinas revolucionárias desenvolvidos além-mar. A escravidão e o comércio de escravos marcaram de maneira profunda o ser social e político da cidade, e sua grande população negra teve influência decisiva sobre hábitos, sinais e símbolos locais. Crenças e práticas religiosas apresentavam valores provenientes tanto da África como de Portugal. Ao se adaptarem uns aos outros, os soteropolitanos forjaram uma nova cultura com seus próprios modos de ser. Com o passar do tempo, a cidade se tornou única, tão diferente de outras cidades atlânticas como as cidades atlânticas eram diferentes dela.

Links para Download

Link Quebrado?

Caso o link não esteja funcionando comente abaixo e tentaremos localizar um novo link para este livro.

Deixe seu comentário

Mais Lidos

Blog

Alimentar A Cidade: Das Vendedoras De Rua À Reforma Liberal (Salvador, 1780-1860)

Nenhuma cidade alimenta a si mesma. Diferentemente da aldeia ou da vila, uma cidade depende de uma grande quantidade de gente de fora para plantar ou cultivar alimentos, e sobretudo para transportá-los, e de intermediários para comprá-los e revendê-los aos consumidores. Salvador era uma grande cidade nas Américas do fim do século XVIII. Isso nos estimula a investigar não apenas essa malha de relações comerciais, mas também o que seu funcionamento revela sobre a composição social da cidade. Vendedores ambulantes, barqueiros, merceeiros, açougueiros, negociantes de gado, importadores; homens e mulheres; negros, mulatos e brancos; escravos, ex-escravos e livres — são esses os atores. Suas ações ajudaram a forjar a cidade, e seus negócios põem em relevo sua ordem social, seus costumes, suas ideologias e seus conflitos.
Salvador pertencia essencialmente ao mundo atlântico, onde a Europa se encontrava com a África nas Américas. Sua enorme baía faz dela um dos poucos grandes portos do Atlântico Sul. Das ricas terras produtoras de açúcar, tabaco e alimentos em volta da baía — coletivamente chamadas de Recôncavo — vinham os produtos que alimentavam a gente local e eram trocados por uma grande variedade de artigos importados no movimentado centro da cidade. Europeus, africanos, e gente de origem europeia e africana, além de alguns índios, se encontravam em Salvador, estabelecendo vínculos complexos e, simultaneamente, redefinindo as fronteiras que os separavam. Instituições de governo desenvolvidas na Europa foram aplicadas ali a uma população diversa e reformuladas para se adaptarem a um lugar que devia parecer exótico para seus administradores portugueses. Pessoas criadas inteiramente no Brasil argumentavam a favor ou contra princípios econômicos ou doutrinas revolucionárias desenvolvidos além-mar. A escravidão e o comércio de escravos marcaram de maneira profunda o ser social e político da cidade, e sua grande população negra teve influência decisiva sobre hábitos, sinais e símbolos locais. Crenças e práticas religiosas apresentavam valores provenientes tanto da África como de Portugal. Ao se adaptarem uns aos outros, os soteropolitanos forjaram uma nova cultura com seus próprios modos de ser. Com o passar do tempo, a cidade se tornou única, tão diferente de outras cidades atlânticas como as cidades atlânticas eram diferentes dela.

Link Quebrado?

Caso o link não esteja funcionando comente abaixo e tentaremos localizar um novo link para este livro.

Deixe seu comentário

Pesquisar

Mais Lidos

Blog