
Este volume reúne textos de natureza diversa — uma espécie de memória do desafio-trajetória de pensar em música e adjacências. Dele fazem parte
artigos publicados em periódicos especializados, textos apresentados como palestras e conferências, e algumas crônicas escritas para jornal.
O espírito mais sincero é o de uma conversa com o leitor/ouvinte, construído como parceiro de diálogo e dúvidas.
Longe do cultivo de coesão e unidade — até mesmo no que se refere à praxe bibliográfica, que é flexibilizada em alguns momentos—, Invenção & Memória pretende subsistir como uma espécie de painel de iniciativas composicionais discursivas, apresentando incursões diversas sobre temas prediletos de reflexão e de pesquisa.
Quando um músico escreve sobre música, sua consciência tende à intranquilidade. Ele sabe, internamente, em alguma camada cognitiva, que o objeto de referência é tão mais sublime, misterioso e pulsional…
Agora mesmo, ouvindo o primeiro movimento do quarteto de cordas de 5chumann op. 41, que balança como uma espécie de maré fluvial sonora, tenho plena consciência de que o resto é garatujas, de Shakespeare a Joyce, ou então, dito de outra forma, o resto, quando presta alguma coisa, é porque tem um jeito e um trejeito de música, uma aspiração à transcendência da palavra, à flutuação do sentido.
Assim, loucamente, autisticamente, funciona essa camada da cabeça do músico, e o fato de pegar da pena representa para eie uma espécie de traição. Sobre o que não se pode falar, é preciso caiar, dizia o músico Wittgenstein no final de seu Tratado Lógico Filosófico.
Mas ninguém calou. Dois mil e quinhentos anos de música ocidental, e não sei mais quantos de China, Índia, civilizações alternativas (que horror de preconceito), todo mundo quer falar sobre música, principalmente os envolvidos, o que mostra que essa sensação de traição à música além de incômoda é gostosa o suficiente para exigir mais e mais palavras sobre música.
Talvez, pontua o psicanalista músico, falar sobre música represente uma libertação desse amor perigoso, dessa maré fluvial que levou o próprio compositor (Schumann) à loucura; a boa música romântica tem esse convite para o desespero embutido e encasquetado nela; por que?
A música de transe, também, embora de forma bem diferente. A música religiosa permite o acesso ao sublime. O órgão de Bach envolve o ouvinte naquela voluta barroca e quando ele percebe já está além das nuvens.
Algo parecido acontece com a música de Bob Marley (ele próprio foi para as nuvens). As nuances que ele usa em This is Love, são extremamente cativantes.











