Franz Kafka – O Desaparecido Ou Amerika
Apesar de ser o primeiro romance escrito por Franz Kafka, O Desaparecido só seria publicado, com o título de Amerika, em 1927, após O Processo (1925) e O Castelo (1926).
Os três romances ficaram “inacabados” e sofreram certas “adaptações” da parte do amigo de Kafka, Max Brod, que herdara o espólio do grande escritor de Praga com a incumbência de destruí-lo. Brod, sabidamente, não apenas não cumpriu essa cláusula do testamento de Kafka, como tratou de editar e divulgar a sua obra.
Com a presente publicação, o leitor brasileiro tem acesso pela primeira vez a uma tradução de O desaparecido realizada a partir de sua edição crítica, estabelecida por Jost Schillemeit em 1983, que recupera o texto original da obra e assinala passagens suprimidas nos manuscritos do autor.
Redigido entre 1912 e 1914, O Desaparecido é uma espécie de antirromance de formação, uma vez que Kafka se lança em uma tentativa paradoxal de narrar histórias em uma era pós-narrativa.
Em vez de contar histórias que se desdobram no tempo, ele descreve instantâneos que revelam a triste situação do sujeito e de sua desaparição na modernidade. Daí o romance se chamar, com razão, O Desaparecido. Daí também o autor eleger a América, mais especificamente os Estados Unidos, como seu cenário.
O Novo Mundo permite apresentar de modo especialmente gritante a situação do homem moderno como alguém que não tem história — ou caráter. A isso corresponde uma nova experiência do tempo: este não se decanta mais em experiência. Karl Rossmann, o protagonista do romance, sempre volta a ser julgado e condenado — desde sua cidade natal, na Europa, de onde seus pais o baniram, passando pelo tio, pelos conhecidos desse tio, por seus empregadores e “amigos”.
As figuras de Kafka costumam habitar um local indeterminado, entre o mundo dos homens, dos animais e das coisas. Neste livro, Robinson, um desses “amigos”, aparece como um meio-termo entre um cachorro e uma criança chorona.
Ao mesmo tempo, os representantes do poder normalmente têm dimensões monumentais em Kafka: assim ocorre com o grande capitalista senhor Green, bem como com toda a paisagem norte-americana urbana e natural. Desse modo, tudo beira o grotesco, o que lembra tanto a tradição rabelaisiana — sobretudo com a figura enorme de Brunelda — como o cinema de um Chaplin.
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