Tomando o cinema como o contexto para construção de sentido, Célia Nunes e Sílvia Guerra, terapeutas familiares e autoras deste livro, entrelaçam, com maestria e estética, conceitos teóricos que permeiam distintas abordagens da terapia familiar e a vida vivida por protagonistas de distintos gêneros literários de filmes exibidos nos nossos cinemas.

O cinema, considerado a sétima arte, veicula ideologias, valores culturais, tramas e dramas relacionais e as micropolíticas da vida cotidiana. Seus efeitos profundamente tocantes decorrem, não apenas das narrativas de seus scripts, mas de suas tomadas de cena, colocando em diferentes dimensões imagens grávidas de sentido e em diferentes perspectivas e distintos movimentos e tempos. Jogos de cenas, contraposição de imagens contrastantes, jogos de luzes e cores, do zoom à imagem panorâmica, no uso do tempo vivido, não necessariamente de modo cronológico, o cinema pode ser considerado uma arte de alto impacto, podendo envolver os espectadores em sentidos inimagináveis, conforme a história do filme se miscigena com as suas próprias histórias. Nesse sentido, é poético.
Conforme Célia e Sílvia com propriedade o afirmam, “[...] o cinema é um produto cultural que reflete as relações humanas que ocorrem dentro de uma determinada sociedade [...]”, podendo tanto transmitir a ideologia reinante, “[...] como denunciar as injustiças vigentes.” Mais do que construir uma réplica da realidade das vidas, uma das grandes importâncias dessa arte decorre da possibilidade de incluir o espectador como coautor da história apresentada, conforme ao ser tocado pelo que vê, pode refletir e se posicionar diante de questionamentos que muitas vezes um filme suscita.
Entretenimento, lazer, mas também contexto para construção de significados e revisitação de valores e posicionamentos, o cinema apresenta-se como uma excelente ferramenta conversacional para terapeutas e educadores. Terapeutas familiares têm-se valido dos filmes como recursos importantes para criar espaços de reflexão e conversação sobre problemas da vida cotidiana, junto a famílias, casais e clientes em geral. Ao apresentar histórias vividas em narrativas e imagens e podendo transcender as dimensões de tempo presente, o cinema permite às pessoas revisitarem suas próprias histórias, podendo ser tocadas de modo a favorecer a construção de novos entendimentos e, portanto, de novos significados.