
O título e o subtítulo desde livro respondem a dois âmbitos diferentes do trabalho antropológico: a etnografia e a teoria. O título, Já Viste Como Chora Uma Cerejeira?, é uma pergunta que me foi feita por um de meus informantes durante uma tarde de primavera de 1990. Tal pergunta me fez pensar durante muito tempo na estruturação da linguagem na esquizofrenia e, mais concretamente, no papel das metáforas e pseudometáforas neste tipo de discursividade.
Por sua parte, o subtítulo, Passos Para Uma Antropologia Da Esquizofrenia, pode ser entendido como uma apropriação não dissimulada do título do conhecido texto de Gregory Bateson, Passos para uma ecologia da mente, onde de forma precoce se propõe uma teoria antropológica da esquizofrenia, baseada nos sistemas de condutas e intercondutas dentro da estrutura familiar.
A proposição de Bateson me permitiu confiar, desde o primeiro momento, na possibilidade de uma aproximação antropológica à esquizofrenia. Esse projeto foi sendo percebido como uma tarefa mais viável a partir do descobrimento da profusão de literatura antropológica que existia sobre esta problemática. Não obstante, sempre tive a sensação de que dificilmente exploraria esse tema sem a leitura prévia de Passos para uma ecologia da mente. Imagino que isso tenha a ver com o talento entusiasta e permanentemente reflexivo de Gregory Bateson.
Da combinação nem sempre homogênea de etnografia e teoria surge precisamente este livro, que está estruturado em quatro capítulos: “A enfermidade”, “A cidade”, “O confinamento” e “A linguagem”.
Com exceção do primeiro, o resto dos capítulos podem ser entendidos com uma graduação desde fatores mais globais, ou macro, que afetam na esquizofrenia (a vida urbana, a pobreza, a economia política), até às dimensões mais locais, ou micro (a instituição, as experiências subjetivas, as discursividades). No entanto, isso é assim somente desde uma visão geral, pois em alguns momentos se combina informação global com casos individuais para estabelecer relações entre estes níveis analíticos da realidade.
Os dados etnográficos utilizados para a elaboração de Já Viste Como Chora Uma Cerejeira? provém do meu trabalho de campo em diferentes instituições psiquiátricas de Barcelona ao longo de três anos (1990-1993): Hospital Clínico de Barcelona (4 meses), Institut Frenopàtic (6 meses), Area de Rehabilitación Integral (ARI) (7 meses) e Centre de Assistència Primària en Salut Mental de Gràcia y ARAPDIS (9 meses). Para salvaguardar a intimidade dos informantes, não nomearei as instituições no texto.
