Jean-Baptiste Baratte, um jovem engenheiro iluminista, tido como amante de Voltaire, recebe uma missão desafiadora do rei Luis XVI: livrar-se da igreja e do cemitério de Les Innocents. No inicio, o protagonista percebe nessa empreitada uma chance de limpar o fardo da historia, a tarefa perfeita para um homem moderno, do futuro, da razão. Ele logo sente, porém, que a igreja e o cemitério são apenas prenúncios de uma queda maior que ainda esta por vir.
Miller utiliza seu herói, Jean-Baptiste, e a destruição da igreja e do cemitério como formas de dramatizar uma das grandes questões do Iluminismo: qual e a situação do passado? E algo a ser valorizado e preservado ou deveria ser simplesmente esquecido? Esse aniquilamento e utilizado pelo autor como uma metáfora do progresso e da disposição de deixar o passado corrupto e tirânico para trás.
Puro possui um estilo elegante, e primorosamente escrito e tem um final diferente do que o leitor possa imaginar. Um livro sobre a impureza da sociedade da época, o que o protagonista reconhece como a sujeira do mundo. Uma trama que se resume a favor da bagunça, do enfrentamento.
Esta é uma obra de ficção que combina o real com o imaginário, embora a Igreja e o cemitério certamente tenham existido, em boa parte conforme são descritos na história. Hoje, é claro, nada existe para ser visto do cemitério, salvo uma pequena praça cercada de restaurantes e lanchonetes junto ao shopping center subterrâneo de Les Halles. A velha fonte, a fonte italiana, foi deslocada, no século XIX, para o meio da praça, onde faz as vezes de ponto de encontro e lugar de descanso para os frequentadores do shopping. Os ossos do cemitério podem ser vistos nas Catacumbas de Paris, para onde mais tarde foram levados os ossos de outros cemitérios: inúmeros restos mortais arrumados ao longo de milhares de metros de corredores gotejantes muito abaixo do tráfego urbano. Vítimas do Terror que sobreveio, passados poucos anos, à destruição do cemitério supostamente também se encontram escondidas no terreno da velha pedreira. Acima da entrada das catacumbas, há uma inscrição gravada: “Arrête! C’est ici l’Empire de la Mort.” — “Pare! É aqui o Império da Morte.”
O mercado que passou a funcionar no local do cemitério, o Marché des Innocents, foi fechado pela última vez em 1858.