Para compreender-se o papel pontual dos processos ficcionais e temporais em cada etapa da meditação husserliana, torna-se indispensável considerá-la em sua maior amplitude, contemplando a totalidade dos textos disponibilizados mediante o notável empreendimento editorial desenvolvido há décadas pelos Arquivos Husserl de Louvain na coleção Husserliana, em suas três séries: Gesammelte Werke (Hua), Materialien (Mat) e Dokumente (Dok).
Várias divisões de abordagem seriam viáveis, cada uma com suas vantagens e desvantagens peculiares. Opto pela ordenação em consonância ao estatuto outorgado pelo próprio autor a cada grupo de suas manifestações escritas:
1) Livros publicados por Husserl ou preparados por ele em parceria com algum(ns) de seus assistentes (Edith Stein, Martin Heidegger, Ludwig Landgrebe e Eugen Fink) e, alguns dos textos, publicados após sua morte;
2) Ensaios, conferências e recensões (Hua 1, 22, 25 e 27);
3) Análises ex professo dos temas da ficção e do tempo (Hua 23, 33 e Mat 8);
4) Manuscritos de cursos ministrados (vários volumes da Hua e a maioria dos volumes da Mat);
5) Manuscritos de pesquisa (vários volumes da Hua e o volume 8 da Mat);
6) Os 10 volumes de cartas publicadas na terceira subsérie da Dok.
Numa última etapa de análise, mostra-se capital debater com o(a)s principais comentadore(a)s dos temas que privilegio na minha abordagem, visando que, a partir desta Auseinandersetzung, e, à luz dos escritos husserlianos previamente examinados, exponha minhas devidas posições compreensivas.
Infelizmente, no cenário filosófico nacional, mostra-se desconcertante a escassez de obras dedicadas ao pensamento de Husserl e, até onde eu saiba, a ausência de textos específicos sobre os temas que reputo plenamente condutores na abordagem globalizante da meditação husserliana.
Infelizmente, o panorama global dos comentários sobre Husserl, bem como acerca de outros pensadores, mostra que a grande maioria dos intérpretes descura da exigência capital antes referida.
Isto implica, de modo quase inevitável, na construção de moinhos de vento filosóficos, a serem desmontados ou reconstruídos de maneira displicente e irresponsável, num contínuo e multifacetado exercício quixotesco, que é aceitável, e até louvável, na literatura, mas não na filosofia. Se tal procedimento dignifica a primeira, banaliza a segunda.