
O sul do Mato Grosso do Sul é uma bela paisagem – um texto vivo arranjado na mistura de faunas e floras e de seres tecedores de linguagens que as enredam e nelas se enredam no andar da História. Dentre as formas de tecer linguagem, há uma antiga que resiste ao tempo, ao açoite “branco”, e que ousa viver em meio a tantas tecnologias de produzir sentido. A avañe’ẽ persiste como fábrica de metáforas que emergem do encontro entre seres e espaços – dialética da paisagem. Mas essas metáforas evocam também o conflito entre logos e mito e as aflições e violências cicatrizadas na memória.
A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) faz parte desse contexto e passou a ser ponto de encontro entre os karai (brancos) e os ava (indígenas Guarani e Kaiowá). Em um desses encontros, surgiu a ideia de tentar encurtar a distância entre os dois modos diferentes de fazer mundos. E foi assim que Tonico Benites, Adão Ferreira Benites, representantes dos ava e Adilson Crepalde (karai) reuniram-se para colocar um pouco de diversidade na Universidade, fazendo vir ao mundo um livro básico de Avañe’ẽ.
A princípio, o objetivo era apenas organizar situações de comunicação com base nas quais se pudessem aprender algumas noções da cultura guarani-kaiowá e da variação da língua guarani falada pelos Kaiowá. Durante a execução do projeto, contudo, houve a possibilidade e a necessidade de ampliar um pouco mais os objetivos. Para tanto, recorremos a outros materiais anteriormente elaborados, como o Diccionario Castellano-Guaraní/Guaraní-Castellano (2005) e ao Dicionário Guarani-Português ÑE’ẼRYRU AVAÑE’Ẽ (2000).
Apesar dessas consultas e da ampliação do projeto, este livro continua sendo apenas um livro de noções básicas que privilegia as informações de Tonico Benites e Adão Ferreira Benites, falantes nativos da avañe’ẽ e que obviamente trazem em suas informações variantes do guarani, uma vez que, embora haja semelhanças entre o guarani falado pelos Guarani, pelos Kaiowá e pelos paraguaios, há também diferenças.
Como o livro destina-se a não indígenas interessados em conhecer um pouco da língua e da cultura guarani-kaiowá, os diálogos foram elaborados privilegiando-se as situações de comunicação praticadas pelos não índios, o que pode soar um tanto artificial. Imaginamos que a elaboração de diálogos, ainda que “ocidentalizados”, seria uma boa estratégia para ensinar conhecimentos da avañe’ẽ e, ao mesmo tempo, possibilitar elementos de comunicação entre indígenas e não índios.
Sabemos que o domínio da avañe’ẽ depende do envolvimento e da vivência com os falantes dessa língua em situações reais de comunicação, o que envolve uma gama de fatores. O uso da língua no dia a dia da vida indígena é muito mais dinâmico e repleto de variantes linguísticas e culturais.











