Os Espelhos Da América

Quando fez uma das suas peças finais, A Tempestade, William Shakespeare não imaginou a fortuna crítica que a luz do Novo Mundo lançaria sobre esta comédia sombria. Ariel, Caliban, Próspero e Miranda foram fontes inesgotáveis de metáforas para o continente que se tornou  o extremo ocidente.

“Admirável mundo novo”, a expressão da filha do milanês, surge como um repositório de conceitos literários para explicar este quase acidente denominado América. Ricardo Amarante Turatti teve a boa ideia de pesquisar este fio complexo.
Abunda aqui a metáfora de Borges e do Barroco: espelhos; superfícies reflexivas nas quais vemos o que existe e o que desejaríamos existir. O espelho é fiel e deformante, generoso e duro conosco. Espelho dialoga com o olhar para produzir memória/imagem na medida dos nossos desejos e construções. A América tornou-se um espelho amplo sobre o qual muita fantasia literária, muito ensaio e muita violência poderiam ser apostos. A América foi admirável, foi mundo e foi nova, como queria a já citada frase de Miranda.
Mas, e se a metáfora d’A Tempestade não fosse apenas a releitura de um inglês elisabetano? E se fosse um fio condutor que servisse a muitas construções de elites letradas sobre o Novo Mundo, inclusive quando ele já não era mais tão novo? E se o caráter etéreo de Ariel ficasse mais denso e todos pudessem lançar mão deste ser de luz para jogar contra a fealdade de Caliban, a erudição mágica de Próspero ou a ingenuidade de Miranda? E se os jogos da política de Nápoles e de Milão fossem além do pacto social do imaginário de Shakespeare e chegassem a liberais e marxistas em pleno século XX? E se Shakespeare tivesse tocado num  manancial que nunca mais se esgotou? Ricardo teve a ideia e a coragem de fazer estas perguntas. Fez e respondeu, de forma admirável, nestas páginas.
Há três coisas, ao menos, que a pesquisa de Ricardo possibilitou. A primeira, importante, é um inventário destas metáforas depois de Shakespeare. Fundamental para o leitor acompanhar esta narrativa cronológica que passa por vários anos e várias situações. Memória e construção; e Ricardo constrói bem esta narrativa.
Há uma segunda coisa, fundamental, que é como cada elaboração, Rodó ou Retamar, dialogaram com seu momento e suas idealizações, na Montevidéu modorrenta de 1900 ou nos agitos da Casa das Américas, em Cuba revolucionária. Isto seria uma história, bem histórica mesmo, das ideias e sua historicidade genética.

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Quando fez uma das suas peças finais, A Tempestade, William Shakespeare não imaginou a fortuna crítica que a luz do Novo Mundo lançaria sobre esta comédia sombria. Ariel, Caliban, Próspero e Miranda foram fontes inesgotáveis de metáforas para o continente que se tornou  o extremo ocidente. “Admirável mundo novo”, a expressão da filha do milanês, surge como um repositório de conceitos literários para explicar este quase acidente denominado América. Ricardo Amarante Turatti teve a boa ideia de pesquisar este fio complexo.
Abunda aqui a metáfora de Borges e do Barroco: espelhos; superfícies reflexivas nas quais vemos o que existe e o que desejaríamos existir. O espelho é fiel e deformante, generoso e duro conosco. Espelho dialoga com o olhar para produzir memória/imagem na medida dos nossos desejos e construções. A América tornou-se um espelho amplo sobre o qual muita fantasia literária, muito ensaio e muita violência poderiam ser apostos. A América foi admirável, foi mundo e foi nova, como queria a já citada frase de Miranda.
Mas, e se a metáfora d’A Tempestade não fosse apenas a releitura de um inglês elisabetano? E se fosse um fio condutor que servisse a muitas construções de elites letradas sobre o Novo Mundo, inclusive quando ele já não era mais tão novo? E se o caráter etéreo de Ariel ficasse mais denso e todos pudessem lançar mão deste ser de luz para jogar contra a fealdade de Caliban, a erudição mágica de Próspero ou a ingenuidade de Miranda? E se os jogos da política de Nápoles e de Milão fossem além do pacto social do imaginário de Shakespeare e chegassem a liberais e marxistas em pleno século XX? E se Shakespeare tivesse tocado num  manancial que nunca mais se esgotou? Ricardo teve a ideia e a coragem de fazer estas perguntas. Fez e respondeu, de forma admirável, nestas páginas.
Há três coisas, ao menos, que a pesquisa de Ricardo possibilitou. A primeira, importante, é um inventário destas metáforas depois de Shakespeare. Fundamental para o leitor acompanhar esta narrativa cronológica que passa por vários anos e várias situações. Memória e construção; e Ricardo constrói bem esta narrativa.
Há uma segunda coisa, fundamental, que é como cada elaboração, Rodó ou Retamar, dialogaram com seu momento e suas idealizações, na Montevidéu modorrenta de 1900 ou nos agitos da Casa das Américas, em Cuba revolucionária. Isto seria uma história, bem histórica mesmo, das ideias e sua historicidade genética.

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