Neiva Flávia De Oliveira & Outros – Caso Ismene Mendes: O Legado Classista, Machista E Fascista Da Ditadura Civil-Militar
Ismene Mendes (1956-1985), advogada nascida em Patrocínio-MG — onde foi vereadora — graduada pela Universidade Federal de Uberlândia era uma defensora dos direitos trabalhistas e sociais.
Por essa causa, sofreu perseguições, sendo torturada e estuprada.
Sua morte, na época explicada de forma inverossímil, foi investigada pela Comissão da Verdade, que apresenta agora o relatório.
Este não é um livro comum. Mais do que um apanhado de artigos científicos ou o relatório final de um estudo, a presente obra se apresenta como um efetivo projeto de justiça de transição ao combater o silêncio forçado que ocultava a história de repressão à luta e militância na resistência ao regime ditatorial e suas consequências para as camadas mais exploradas da classe trabalhadora.
Até o presente momento, a história oficial sobre a morte da advogada, vereadora e militante da causa dos trabalhadores rurais, Ismene Mendes, por mais incrível que possa parecer, é a de que ela teria tirado a própria vida por meio da inalação de agrotóxicos em seu quarto, após ver frustrada a sua tentativa de conquistar o amor de um latifundiário da região.
Consta ainda que ela teria se “auto-estuprado”, nesse ínterim. Por mais absurda que seja essa estória, evidentemente falsa e incoerente, eram esses os únicos registros oficiais que constavam do inquérito policial que investigou o caso, tendo sido essa a versão utilizada para apagar a história de luta e resistência de Ismene Mendes.
Nesse sentido, ao resgatar a memória e esclarecer os fatos acerca da vida e assassinato de Ismene Mendes, é possível expor o caráter classista, machista e fascista da Ditadura Civil-Militar imposta ao Brasil em 1964, revelando, ainda, as intrínsecas relações de poder e conivência dos agentes públicos do regime com as elites locais que financiaram e apoiaram o golpe desde a sua concepção.
Vale destacar que o caso de Ismene Mendes se mostra como icônico e revelador de características essenciais para a completa compreensão da Ditadura Civil-Militar de 1964 por uma série de motivos e peculiaridades que serão tratadas ao longo do livro.
Inicialmente, destaca-se que se trata de um caso ocorrido em 1985, ou seja, após a aprovação da Lei de Anistia e no momento supostamente marcado pela abertura política e arrefecimento da repressão.
Além disso, o estudo hora posto tem o importante papel de revelar funções não declaradas do regime, como o combate aos sindicatos e grupos que lutavam pelos direitos dos trabalhadores, a manutenção e ampliação do lucro das elites históricas ligadas ao agronegócio, bem como a atuação em favor de diversos outros grupos de interesses conservadores.