Cento e vinte dias, seiscentas paixões. Quatro meses de libertinagem, quatro classes de vícios. A cada dia, cinco modalidades, somando cento e cinquenta por mês. Para dar conta dessas cifras, uma comitiva formada por quarenta e seis pessoas, distribuídas em oito categorias distintas, das quais sete pertencem à classe dos súditos. Oito meninos, oito meninas e oito fodedores. Quatro criadas e seis cozinheiras. Quatro esposas. Quatro narradoras. Por fim, na classe dos senhores, os quatro libertinos que sempre merecem designação individualizada: Curval, Durcet, Blangis e o Bispo.
A esses números que apresentam ao leitor “a narrativa mais impura já escrita desde que o mundo existe”, somam-se outros tantos que servem invariavelmente para precisar, com a maior exatidão possível, as atividades levadas a termo no castelo de Silling. No capítulo dos horários, por exemplo, a jornada é inflexível: os devassos devem acordar diariamente às dez horas da manhã; às onze é servido o desjejum; segue-se a inspeção dos haréns e, entre uma e duas da tarde “e nem mais um minuto”, adverte o narrador, eles permanecem na capela devotada às volúpias coprofágicas. Das duas às três, durante a refeição dos súditos, os senhores descansam na sala de conversação. Seu almoço dura exatamente duas horas e, uma vez terminado, há espaço para um repouso de quinze minutos. Às seis em ponto a comitiva se reúne na Câmara de Assembleias para dar início aos trabalhos do dia, que se prolongam por quatro horas. A ceia é servida às dez da noite, seguida de uma orgia que deve cessar pontualmente às duas da madrugada, quando todos se recolhem.
O protocolo dos horários talvez baste para sugerir a relevância da precisão numérica nesse livro que, a começar pelo título, opera com uma prodigiosa quantidade de algarismos, sinais, medidas, listas e toda sorte de cálculos. Nada escapa à contabilidade do quarteto de Silling, que registra desde o número de garrafas de vinho saboreadas pelos senhores em uma refeição até a quantia de carne branca ingerida por um súdito cujas fezes serão servidas na ceia; desde as proporções dos órgãos sexuais dos fodedores até o inventário de bundas disponíveis para uma orgia; desde o total de chicotadas recebidas pelos súditos em uma noite até o cômputo das mutilações realizadas ao longo de um mês. Nada escapa a essa contabilidade porque, ao lado das cenas lúbricas, as operações aritméticas são fundamentais para singularizar o “catálogo de perversões” que inaugura a obra do marquês de Sade sob o título de Os 120 dias de Sodoma.
120 Dias De Sodoma Ou Escola De Libertinagem
- Literatura Estrangeira
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