Quiçá

Escreveu Tolstói, em um dos inícios de livro mais presentes no imaginário dos leitores, que “todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira”.

Ao ler esta frase, podemos pensar que todas as infelicidades são maiúsculas, descomunais, únicas na sua destruição sistemática do núcleo familiar. A tristeza deixaria marcas infinitas e, por este motivo, seria inesquecível. No entanto, a infelicidade das famílias nem sempre é uma ruptura absoluta com as suas expectativas; ela pode ser sutil, um leve desvio, um ponto fora da linha do gráfico e, apesar disso, não será menos destruidora.
Em Quiçá, novo romance da escritora Luisa Geisler, a infelicidade de uma família jamais é claramente demonstrada, mas espreita em cada página do livro. A tragédia se esconde por trás de cada situação e, quando se fala em tragédia, não é o lugar-comum das novelas e filmes dramáticos, mas a tragédia entoada pelos coros gregos e ecoada nas peças de Shakespeare. Nuvens negras pairam sobre as personagens, que aproveitam os últimos resquícios de sol antes das situações os arrastarem com a fúria das correntezas. Por trazer tal intranquilidade ao leitor, Quiçá não é para ser lido de forma descompromissada, indiferente. Ao contrário: é um romance que mora na instabilidade das situações humanas, na zona sem contornos definidos que separa o certo do errado. É uma literatura trêmula, a gota de orvalho que ameaça se precipitar da folha e permanece, equilibrista, na sua extremidade, ansiando por ficar, mas também disposta a se libertar.
A trama de Quiçá desenvolve-se em três esferas principais. A história central conta a relação de Arthur e Clarissa, dois primos sem muita intimidade, que começam um relacionamento no período em que Arthur vai fazer os seus estudos na cidade grande e passa a morar no mesmo apartamento que Clarissa. A segunda linha narrativa trata do almoço de Natal da família. A superficialidade dos relacionamentos esconde-se sob o verniz da alegria. Os integrantes da família desempenham papéis estereotipados (o tio que fotografa de forma compulsiva e cria poses de felicidade artificial, as tias que fazem uma lasanha e escondem a receita, a “mesa das crianças” onde os menores se concentram pelo enganoso critério etário e sonham com a “mesa dos adultos”). Na terceira esfera, várias pequenas histórias e fragmentos desordenados compõem um mosaico sufocante de vivências e sensações, quase todos rondando a ideia de morte, de suicídio ou do fim de qualquer coisa, desde o término (ou a manutenção) de um relacionamento natimorto até as perguntas falsas de um questionário de jornal em que a entrevistada, no afã de mostrar para os desconhecidos uma felicidade que não possui, tece uma sucessão de inverdades a fim de disfarçar o tédio da sua vida.

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Escreveu Tolstói, em um dos inícios de livro mais presentes no imaginário dos leitores, que “todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira”. Ao ler esta frase, podemos pensar que todas as infelicidades são maiúsculas, descomunais, únicas na sua destruição sistemática do núcleo familiar. A tristeza deixaria marcas infinitas e, por este motivo, seria inesquecível. No entanto, a infelicidade das famílias nem sempre é uma ruptura absoluta com as suas expectativas; ela pode ser sutil, um leve desvio, um ponto fora da linha do gráfico e, apesar disso, não será menos destruidora.
Em Quiçá, novo romance da escritora Luisa Geisler, a infelicidade de uma família jamais é claramente demonstrada, mas espreita em cada página do livro. A tragédia se esconde por trás de cada situação e, quando se fala em tragédia, não é o lugar-comum das novelas e filmes dramáticos, mas a tragédia entoada pelos coros gregos e ecoada nas peças de Shakespeare. Nuvens negras pairam sobre as personagens, que aproveitam os últimos resquícios de sol antes das situações os arrastarem com a fúria das correntezas. Por trazer tal intranquilidade ao leitor, Quiçá não é para ser lido de forma descompromissada, indiferente. Ao contrário: é um romance que mora na instabilidade das situações humanas, na zona sem contornos definidos que separa o certo do errado. É uma literatura trêmula, a gota de orvalho que ameaça se precipitar da folha e permanece, equilibrista, na sua extremidade, ansiando por ficar, mas também disposta a se libertar.
A trama de Quiçá desenvolve-se em três esferas principais. A história central conta a relação de Arthur e Clarissa, dois primos sem muita intimidade, que começam um relacionamento no período em que Arthur vai fazer os seus estudos na cidade grande e passa a morar no mesmo apartamento que Clarissa. A segunda linha narrativa trata do almoço de Natal da família. A superficialidade dos relacionamentos esconde-se sob o verniz da alegria. Os integrantes da família desempenham papéis estereotipados (o tio que fotografa de forma compulsiva e cria poses de felicidade artificial, as tias que fazem uma lasanha e escondem a receita, a “mesa das crianças” onde os menores se concentram pelo enganoso critério etário e sonham com a “mesa dos adultos”). Na terceira esfera, várias pequenas histórias e fragmentos desordenados compõem um mosaico sufocante de vivências e sensações, quase todos rondando a ideia de morte, de suicídio ou do fim de qualquer coisa, desde o término (ou a manutenção) de um relacionamento natimorto até as perguntas falsas de um questionário de jornal em que a entrevistada, no afã de mostrar para os desconhecidos uma felicidade que não possui, tece uma sucessão de inverdades a fim de disfarçar o tédio da sua vida.

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