1808

1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso E Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão E Mudaram A História De Portugal E Do Brasil - Nunca algo semelhante tinha acontecido na história de Portugal ou de qualquer outro país europeu. Em tempos de guerra, reis e rainhas eram destronados ou obrigados a refugiarem-se em territórios alheios, mas nenhum deles foi tão longe quanto o príncipe regente D. João, forçado a cruzar um oceano com toda a família real portuguesa para viver e reinar do outro lado do mundo, enquanto as tropas do imperador francês Napoleão Bonaparte marchavam sobre Lisboa.


Milhares de pessoas o acompanharam na viagem. Foram cem dias entre o céu e o mar, em navios improvisados, abarrotados, infestados de pragas e piolhos, sem conforto algum. Ao chegar ao Brasil, D. João determinou, entre outras medidas, a abertura dos portos, fundou escolas, mandou construir estradas e fábricas, autorizou a publicação de livros e jornais, incentivou a ciência e as artes. Ao regressar a Portugal, em 1821, deixava para trás um país transformado e pronto para a Independência.
O desprezo pela conservação dos monumentos históricos nunca foi novidade no Brasil. No caso de Dom João VI, porém, há um aspecto adicional que acentua a sensação de esquecimento forçado que o cerca. É a forma caricata com que o rei e sua corte costumam ser tratados nos livros, no cinema, no teatro e na televisão. Um exemplo é o filme Carlota Joaquina - a princesa do Brasil, da atriz e diretora Carla Camurati. A rainha, que dá nome à obra, é apresentada como uma mulher histérica, pérfida e ninfomaníaca.
Dom João, como um monarca abobalhado e glutão, incapaz de tomar uma só decisão.
Enquanto escrevia este livro, perguntei a Camurati, num almoço em São Paulo, por que havia construído os personagens dessa forma. "Porque não pude evitar", ela me respondeu. "Quando comecei a pesquisar, fui me deparando com tipos cada vez mais hilários e absurdos, a tal ponto que se tornou irresistível retratá-los assim."
O propósito de 1808 é resgatar a história da corte portuguesa no Brasil do relativo esquecimento a que foi confinada e tentar devolver seus protagonistas à dimensão mais correta possível dos papéis que desempenharam duzentos anos atrás. Como se verá nos capítulos adiante, esses personagens podem ser, sim, inacreditavelmente caricatos, algo que se poderia dizer de todos os governantes que os seguiram, inclusive alguns muito atuais. Obviamente, o Brasil de Dom João VI não se resume a graçolas.

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1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso E Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão E Mudaram A História De Portugal E Do Brasil

– Nunca algo semelhante tinha acontecido na história de Portugal ou de qualquer outro país europeu. Em tempos de guerra, reis e rainhas eram destronados ou obrigados a refugiarem-se em territórios alheios, mas nenhum deles foi tão longe quanto o príncipe regente D. João, forçado a cruzar um oceano com toda a família real portuguesa para viver e reinar do outro lado do mundo, enquanto as tropas do imperador francês Napoleão Bonaparte marchavam sobre Lisboa.
Milhares de pessoas o acompanharam na viagem. Foram cem dias entre o céu e o mar, em navios improvisados, abarrotados, infestados de pragas e piolhos, sem conforto algum. Ao chegar ao Brasil, D. João determinou, entre outras medidas, a abertura dos portos, fundou escolas, mandou construir estradas e fábricas, autorizou a publicação de livros e jornais, incentivou a ciência e as artes. Ao regressar a Portugal, em 1821, deixava para trás um país transformado e pronto para a Independência.
O desprezo pela conservação dos monumentos históricos nunca foi novidade no Brasil. No caso de Dom João VI, porém, há um aspecto adicional que acentua a sensação de esquecimento forçado que o cerca. É a forma caricata com que o rei e sua corte costumam ser tratados nos livros, no cinema, no teatro e na televisão. Um exemplo é o filme Carlota Joaquina – a princesa do Brasil, da atriz e diretora Carla Camurati. A rainha, que dá nome à obra, é apresentada como uma mulher histérica, pérfida e ninfomaníaca.
Dom João, como um monarca abobalhado e glutão, incapaz de tomar uma só decisão.
Enquanto escrevia este livro, perguntei a Camurati, num almoço em São Paulo, por que havia construído os personagens dessa forma. “Porque não pude evitar”, ela me respondeu. “Quando comecei a pesquisar, fui me deparando com tipos cada vez mais hilários e absurdos, a tal ponto que se tornou irresistível retratá-los assim.”
O propósito de 1808 é resgatar a história da corte portuguesa no Brasil do relativo esquecimento a que foi confinada e tentar devolver seus protagonistas à dimensão mais correta possível dos papéis que desempenharam duzentos anos atrás. Como se verá nos capítulos adiante, esses personagens podem ser, sim, inacreditavelmente caricatos, algo que se poderia dizer de todos os governantes que os seguiram, inclusive alguns muito atuais. Obviamente, o Brasil de Dom João VI não se resume a graçolas.

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