O mundo evolui e a humanidade se transforma, enquanto sofre uma das mais profundas crises da história. Podemos repelir algumas das novidades que a civilização tecnológica moderna nos proporciona. Podemos temer, com razão, sua destruição cataclísmica. Seu suicídio. Mas temos sempre que enfrentar a realidade do moderno, o que quer dizer do futuro na prenhez do presente. O futuro está aberto e a história é imprevisível.
O futuro é sempre criado, é sempre novo, sendo o risco o preço da mutação evolucionária.
Até princípios deste século, os que se negavam a aceitar as transformações aceleradas da realidade contemporânea eram tidos como “conservadores”. Eram em geral autoritários. Monarquistas em matéria política. Eurocêntricos e encontradiços em círculos abastados, de uma certa idade e educação. Às vezes racistas e antissemitas. E concentravam-se em grande número no seio da Igreja católica. No Syllabus dos erros da civilização contemporânea, Pio IX colocou Roma fortemente do lado da reação conservadora, ainda escarmentada pelas sequelas da Revolução francesa. Pio X condenou oficialmente o “modernismo” na encíclica Pascendi, de 1907. As catástrofes políticas da primeira metade do século confundiram as questões entre o progresso e o conservadorismo, entre o avanço criador e a estagnação reacionária, substituindo a alternativa por uma falsa dicotomia político-ideológica de esquerda x direita — produto intelectual espúrio do romantismo jacobino de 1793 e 1848. Agora, no final desta centúria e deste milênio, creio que uma nova e mais esclarecida perspectiva se impõe, graças à qual contemplamos a paradoxal reversão de posturas filosóficas, obediente ao mecanismo contraditório da dialética da razão.
Com efeito, eis o paradoxo: os intelectuais de esquerda que se autointitulam “progressistas” são hoje “ecologistas” e os maiores inimigos das transformações que o mundo moderno nos propõe. Inversamente, os mais leais seguidores da clássica Filosofia Perene são aqueles que mais abertos se declaram, mais se arriscam diante das alternativas geradas pelo Moderno. Do mesmo modo, os chamados teólogos da libertação, longe de promoverem a liberdade, o desenvolvimento e o progresso, fazem uma opção preferencial pela pobreza do passado colonial, recusam-se a aceitar as propostas imperativas de controle da natalidade, atêm-se à velha estrutura do clericalismo autoritário e paternalista — como se sua intenção fosse recriar a república teocrática dos guaranis. O milenarismo dos deserdados constitui a velha promessa compensatória para aqueles maniqueístas que são incapazes de arrostar os desafios de um mundo tecnológico que se transforma e deixa para trás os inadaptados, os ignorantes, os preguiçosos, os seguidores passivos de lideranças carismáticas, os que perderam o bonde do Moderno.
O Dinossauro
- Ciências Sociais, Economia
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