A poesia se revela na forma, indissociável dela, ela mesma. É a fabulosa alquimia da linguagem, que para muitos linguistas é responsável mesmo pela estruturação do pensamento. É no uso desse instrumento – a linguagem – e em seu código específico – a língua, que o poeta pode criar seu universo de significados pela manipulação dos significantes, sem perder de vista, que mesmo usando signos alheios ao código – língua, como expressões visuais, ideogramas, espaço em branco/preto, está comprometido com o fato de que esses traços significantes devem ser da compreensão partilhada pelo meio social.
Dai a desimportância da linguagem afásica de certa “poesia” em voga. A fragmentação sintática, o ilogismo, o descompromisso com a escrita, que muitos pensam ser novidade, perdem-se nas experiências cansadas, nos caminhos fechados de futuristas, surreais, ou dadaístas. Muitas vezes essas explosões refletem apenas o despreparo intelectual, o desconhecimento da tradição, a fuga do compromisso com o conhecimento.
Estou certo de que essa tendência é a amostragem de um universo socio-cultural em decomposição. Da falta de perspectivas e onde se inscreve em caracteres alarmantes a falência de nosso sistema de ensino e da nossa capacidade de transmissão de cultura. A continuar a incompetência da escola, em todos os níveis, cada vez mais as novas gerações parecerão a órfãos do conhecimento, a legiões de indigentes mentais.
Entre os novos poetas que vejo surgindo, em avalanche, principalmente em Goiás, poucos se dedicam ao estudo, poucos escolhem o caminho difícil da disciplina e da pesquisa. No meio da indigência geral, mal escreve-se um poema, mal se inicia com alguma publicação e já se colocam fora da crítica, candidatos a glória, às academias.
Mas nem tudo está perdido. Há os que tomam consciência das responsabilidades do escritor. Esses não se conformam com o anedótico, com o folclórico e cobram para si a dignidade de praticantes de um ofício sério. Entre esses, vejo crescendo o jovem Goiamérico Felício. Chega agora com este Funesta Festa. Já sabe bem que só irá até onde seus próprios pés o levarem. Não conta com louvações, nem de seu irmão muito talentoso.
Seu trabalho reflete as angústias de sua geração, mas dentro de uma perspectiva de historicidade. Sabe bem onde se situam os males do mundo e se lança contra essas forças destruidoras com seus “versos amargos e pungentes, porém tão reais”. Pois vem de um tempo onde “Crianças raquíticas e famintas/ se interpunham em nosso caminho”. O medo, a solidão a insegurança deste tempo atingem o poeta com sua sensibilidade. Em resposta ele apostrofa, grita, e fala em nome de sua geração. Ele que viveu a Guerrilha do Araguaia, a crise da universidade, a noite da exceção, não poderia falar ainda dos campos e das flores por nascer. Seu grito é de perplexidade e busca de caminhos.
Funesta Festa
- Poesia
- 21 Visualizações
- Nenhum Comentário
Link Quebrado?
Caso o link não esteja funcionando comente abaixo e tentaremos localizar um novo link para este livro.