
Com este volume – Correspondência – a Topbooks encerra a publicação da Obra Completa de Rimbaud, depois de proceder à reedição dos tomos anteriores, Poesia Completa e Prosa Poética.
Fica assim o leitor brasileiro, a partir de agora, na posse de tudo o que foi escrito pelo gênio de Jean Nicholas Arthur Rimbaud, desde seus primeiros trabalhos escolares de 1864 até a última carta, ditada à sua irmã Isabelle, já em seu leito de morte no hospital de Marselha, em 1891.
Tendo rompido com a poesia quando tinha apenas 21 anos, depois de vaticinar em “Uma Estadia no Inferno”: Força é que um dia eu me vá para bem longe, pois tenho que ajudar os outros, é meu dever – o poeta de Charleville empreende, a partir de 1880, uma série de viagens pelo Oriente, numa errância que iria durar 11 anos, durante os quais buscou desesperadamente acumular riqueza para se tornar independente e ajudar os seus.
Com esse gesto, assume uma personalidade irreconhecível para aqueles que só o apreciavam literariamente. Com ela pareceu adquirir – ainda conforme suas palavras premonitórias em “Une Saison” – o segredo de “mudar a vida”, ou, neste caso, mudar de vida (Du musst dein Leben ändern, diria Rilke bem mais tarde), pois essa “existência africana” pode ser considerada a antítese daquela anterior, em que buscava uma realização meramente literária, entregue tão-só às aventuras do espírito.
Estas duas vidas, estas existências opostas podem ser aqui observadas na leitura integral de sua correspondência: as chamadas “cartas da vida literária” (período que vai de 1870 a 1875) contrapostas às “cartas africanas” (que abrangem de 1880 a 1891).
O abandono da literatura, no caso de Rimbaud, foi realmente total. Depois das culminâncias poéticas das “Iluminações” – as últimas das quais são datadas por alguns estudiosos como sendo de 1875 – nada escrito por ele foi encontrado que se possa classificar de “poético”.
O que deixou de seu punho após essa data são apenas estas cartas dirigidas aos familiares, a uns poucos amigos e a seus associados comerciais, escritas sem preocupação estilística, meramente noticiosas, informativas.
Mesmo em duas ocasiões, ao publicar no jornal Le Bophore Égyptien, do Cairo, em agosto de 1887, o relato de sua viagem do Choa ao Harar, a linguagem usada é antes a de um explorador, a de um observador geográfico, do que a de um ex-poeta.
E quando escreve, com o intuito de ser editado em Paris, uma “reportagem” para ser enviada à Sociedade de Geografia, nem mesmo assim o tom se sobressai do convencional-científico para adquirir uma fulgurância qualquer de sua antiga “prosa de diamante”.
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