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Neste sétimo volume da coleção Feminismos Plurais, o doutor em Ciências Sociais e babalorixá Rodney William trata o tema da apropriação cultural sob a ótica histórico-cultural do colonialismo, relembrando o processo de aculturação e aniquilamento dos costumes pelo qual passou os povos escravizados. Faz, a partir daí, a conexão com as práticas predatórias dos mercados capitalistas colonizadores atuais, que se valem dos traços culturais de um povo para lucrar, e esvaziam de significado esses símbolos de pertencimento.
Exu Olojá é o dono do mercado. É quem preside todas as trocas, intercâmbios, escambos, transações, negociações, interações e a circulação de bens e produtos. Exu é o princípio dinâmico, a comunicação, o movimento. Senhor da reciprocidade, da sociabilidade e de todas as relações. Mensageiro entre todos os mundos. Exu fala todas as línguas, come tudo que a boca come, bebe tudo que a boca bebe. Ordem e desordem do universo. Exu faz o erro virar acerto e o acerto virar erro. O mais humano dos Orixás vive nas encruzilhadas e mata um pássaro ontem com a pedra que atirou hoje. Exu é memória, é história, é vida. Mas o que tem a ver Exu com o tema da apropriação cultural?
Enquanto princípio dinâmico que permite o estabelecimento de trocas entre os diversos aspectos do mundo, especialmente entre o coletivo e o individual, Exu institui a reciprocidade como um valor negro-africano. Como bem adverte Sidnei Barreto Nogueira, doutor em semiótica e babalorixá, se a banca do mercado tem dois lados, quem vem pra trocar e nada deixa pratica uma extorsão, um roubo. Nas estruturas de opressão que caracterizaram o colonialismo, a apropriação cultural foi uma estratégia eficiente que continua sendo usada como instrumento de dominação. Na tradição nagô, a lógica da circulação se contrapõe à acumulação.
Por que, então, começar a reflexão sobre Apropriação Cultural a partir da Troca? Reposicionar a discussão sobre o tema da apropriação se torna uma árdua tarefa após ter sido um assunto recorrente nos últimos anos, principalmente em razão de todas as polêmicas geradas por algumas situações que reverberaram nas redes sociais e na mídia, obrigando especialistas a explicar “o que podia ou não podia”, “por que não podia”, “por que podia, mas não devia” e assim por diante, como se esse fosse o debate central em torno da questão. Veremos que, ao contrário do que foi divulgado, a discussão sobre o tema é muito mais profunda.
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