
Três inspirações moveram-me em direção à escrita desta obra e à conceituação/proposição do Método Contrastivo vinculado à etnopesquisa. A primeira nasceu a partir das inquietações dos nossos estudantes de pós-graduação quanto à realização de estudos multicascos e abordagens multiexperienciais em face da complexidade requerida pelo Método Contrastivo.
A segunda adveio da tensão epistemológica e metodológica construída pela relação entre a tradição da pesquisa comparativa de inspiração evolucionista e a inflexão relacional e singularizante da ideia de uma Etnopesquisa Contrastiva, inaugurada como concepção no seio do meu grupo de pesquisa. Quanto à terceira, inspirou-se na minha sensibilidade em face das inquietações crítico-antropológicas da pesquisadora Sílvia Michele Macedo de Sá, no que concerne às suas interpelações sobre as bases epistemológicas e metodológicas de caris evolucionista e simetrizante da pesquisa comparativa em antropologia e seus efeitos colonialistas.
Transversalizavam essas inspirações e inquietações que nos aproximavam, ou seja, o convencimento de que a comparação evolucionista simplifica e essencializa, muitas vezes coloniza e exclui, ao passo que o Método Contrastivo trabalha para não perder a singularidade e a complexidade das realidades humanas nas suas heterogeneidades irredutíveis.
Na sua origem, a palavra contrastar vem do verbo contrastare que, em latim, numa das suas variações importantes, aparece com o sentido de “resistir”. Da perspectiva das minhas apropriações, recontextualizo esse sentido a partir da ação de reexistir, na medida em que compreendo a singularidade que reexiste sempre como potência singularizante, generativa, portanto, em face das minhas opções epistemológicas acionalistas e etnoconstitutivas.
Evidencia-se, assim, uma perspectiva heterárquica de construção do conhecimento que pode encetar possibilidades de compreensões relacionais entre singularidades. Vale dizer que, enquanto itinerância heurística, o relacional é fonte rica em transduções, ou seja, acontecimentos e emergências surgem tão somente do fenômeno em si e suas relações acontecimentais.
Dessa forma, quando duas entidades se encontram num certo nível de interação, nem todas as propriedades da nova entidade são necessariamente uma consequência lógica, previsível e predizível das propriedades dos seus componentes.
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