Marcelo Ferreira – Curso De Semântica Formal
O sistema interpretativo que desenvolveremos neste livro parte de três considerações, até certo ponto, intuitivas.
A primeira delas é a de que saber o significado de uma sentença (declarativa) parece relacionado a saber as condições para que a sentença seja verdadeira.
Se sabemos o significado da sentença “tem mais de dez pessoas dentro desta sala”, podemos não saber se ela é verdadeira ou falsa, mas sabemos como o mundo deve ser para que ela seja verdadeira.
Sabemos, por exemplo, que é necessário que o número de pessoas no interior da sala seja superior a dez, mas que o numero exato não é relevante. Sabemos, por outro lado, que é irrelevante haver ou não pessoas próximas à sala, ou as pessoas dentro dela serem homens ou mulheres, ou a sala ser grande ou pequena.
Enfim, saber o significado de uma sentença se assemelha a saber as condições necessárias e suficientes para que a sentença seja verdadeira, ou, posto de maneira mais concisa, saber suas condições de verdade.
Tendo isso em mente, exploraremos a ideia de que as condições de verdade de uma sentença sejam o seu próprio significado.
A segunda consideração é que o significado de uma sentença é produto do significado das palavras que a compõem e da maneira como estas palavras estão agrupadas, ou seja, da estrutura sintática da sentença.
Assim, não é surpresa que o significado de “Pedro beijou Maria” difere do significado tanto de “Pedro abraçou Maria” quanto de “Maria beijou Pedro”. No primeiro caso, são palavras distintas e, no segundo, são as mesmas palavras arranjadas de maneira distinta.
Radicalizando um tanto esta intuição, parece interessante explorar a ideia de que o significado de uma sentença dependa exclusivamente das palavras e da estrutura sintática que compõem a sentença.
A terceira e última consideração é que expressões linguísticas como palavras, sintagmas nominais e verbais, além das próprias sentenças nos remetem a certas entidades ou a certos aspectos do mundo.
Uma possibilidade bastante razoável para começar a compreender esse fato é assumir que as expressões linguísticas se relacionam, elas mesmas, direta ou indiretamente, com as coisas ou fatos do mundo, ou seja, elas têm referência.
A que exatamente elas referem, é algo a ser decidido caso a caso. Assim, buscaremos um sistema que seja referencial ou, num jargão mais técnico, extensional, mas sem com isso igualarmos significado e referência (extensão).
Ou seja, queremos capturar a intuição de que os sintagmas nominais “o presidente do Brasil em 2006” e “o sucessor do presidente FHC” se referem ao mesmo indivíduo, Lula, mas que nem por isso têm o mesmo significado e, portanto, contribuem de maneiras distintas na derivação das condições de verdade das sentenças em que ocorrem.
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