
Os estudos de Luís Gomes sobre a Foia dos Rocêro deram frutos em sua dissertação, no mestrado, e em sua tese, no doutorado. Um estudo profundo, cuidadoso e minucioso que aqui se encontra em forma de livro. Ao lembrar da sua defesa de mestrado, em 2009, e do sucesso que foi a defesa de sua tese, me pego sorrindo e a cantar um trecho da música de Vinícius de Moraes, na voz de Toquinho, que aqui virou título deste início de leitura.
Nas religiões de matriz africana, as folhas são elementos essenciais para manifestação de forças cósmicas, sem os quais não há cosmos, não há vida, não há história, não há nada. Kò sí ewé, kò sí òrìsà. Sem folha, não há orixá. E sem orixá, não há nada. Essa brincadeira que aqui proponho entre as folhas e as foia nada tem de piegas, muito menos de inocente, ou, pior, de devaneio.
Assim como Tatamirô apanha folha por folha para aprender, para se fortalecer, para viver, para ajudar a dar vida e para ensinar, Luís Gomes apanha Foia por Foia, tira o sumo, nos banha e entoa cantigas mí(s)ticas que narram e nos ajudam a entender melhor a constituição histórica da língua portuguesa, a nossa história, a nós mesmos.
Utilizando-se dessa sabedoria ancestral e de ancestrais antes dele, como Serafim da Silva Neto, Joaquim Mattoso Câmara Júnior, Ivo Castro, Rosa Virgínia Mattos e Silva, Ilza Ribeiro, dentre muitos outros, Luís recorre aos procedimentos de uma edição conservadora de um jornal que circulava na Bahia entre os séculos XIX e XX, a Foia dos Rocêro, de autoria de Mario Paraguassu. A edição, com o nome sugere, tem o objetivo de manter o mais original possível a escrita, o que possibilita e facilita estudos das mais diversas áreas sobre esse objeto.
No seu caso, para além de um estudo de cunho filológico e linguístico, Luís possibilita (possibilita porque não foi seu objetivo final, mas acaba, ainda assim, por fazê-lo) um melhor entendimento da socio-história da língua portuguesa no Brasil, bem como uma tímida chance de ampliação da configuração político-linguística da língua portuguesa na Bahia nessa temporalidade. Ou seja, testemunho histórico e linguístico.
Ao nomear o jornal como Foia dos Rocêro Paraguassu reforça (não faz muita diferença saber se foi intencional ou não) uma identidade social e linguística. O que é uma atitude política. Dessa forma, ele nos aponta para uma incursão sociolinguística e política do termo. Falo sociolinguística não como uma área de conhecimento, mas como uma indissociabilidade da língua e da sociedade; dessa simbiose.
Com o auxílio da edição conservadora, temos o testemunho linguístico de uma escrita enquanto decalque de oralidade, o que, em ambos os casos, nos revela o que Luís chamou em sua tese de “um flagrante do português brasileiro”, cuja normatização e constituição se inicia em período análogo.
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