Melhor dizer de uma vez: o homem morreu. Não, não basta. Serei mais preciso: o Romancista (assim mesmo, com maiúscula) morreu. Vocês já sabem de quem estou falando. Não é mesmo? Bom, vou tentar de novo: o Grande Romancista da língua inglesa morreu. O Grande Romancista da língua inglesa, polonês de nascimento e marinheiro antes de escritor, que passou de suicida fracassado a clássico vivo, de vulgar contrabandista de armas a Joia da Coroa Britânica, morreu. Senhoras, senhores: Joseph Conrad morreu. Recebo a notícia com familiaridade, como se recebe um velho amigo. E neste momento me dou conta, não sem alguma tristeza, de que passei a vida a esperá-la.
Começo a escrever com todos os jornais de Londres (suas letras microscópicas, suas colunas desordenadas e estreitas) abertos sobre o couro verde de minha escrivaninha. Por intermédio da imprensa, que desempenhou papéis tão diferentes ao longo da minha vida – às vezes ameaçando destruí-la e às vezes conferindo-lhe o escasso brilho que tem –, fico sabendo do infarto e de suas circunstâncias: a visita da enfermeira Vinten, o grito que se ouve do andar de baixo, o corpo que tomba da cadeira de leitura. Por intermédio do jornalismo oportunista assisto ao enterro em Canterbury; por intermédio das impertinências dos repórteres vejo quando baixam o corpo e posicionam a lápide, aquela lápide eivada de erros (um ka fora do lugar, uma vogal trocada num dos nomes). Hoje, 7 de agosto de 1924, enquanto na minha distante Colômbia são celebrados os cento e cinco anos da batalha de Boyacá, aqui na Inglaterra, com pompa e cerimônia, lamenta-se o desaparecimento do Grande Romancista. Enquanto na Colômbia se comemora a vitória dos exércitos independentistas sobre as forças do Império Espanhol, aqui, neste solo deste outro Império, foi enterrado para sempre o homem que me roubou…
Mas não.
Ainda não.
Ainda é cedo.
Cedo para explicar as formas e qualidades desse roubo; cedo para explicar qual foi a mercadoria roubada, quais foram os motivos do ladrão, quais os danos sofridos pela vítima.
História Secreta De Costaguana
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