O título deste trabalho coloca-nos automaticamente na incandescência da questão que ele pretende abordar: como acoplar ironia e teoria de argumentação?
Se é este macro-objectivo que o anima e o habita, é também nele que se encadearão todos os aspectos que lhe são implícitos. Deste modo, explorar a relação entre ironia e argumentação, perpassando, se não mesmo resvalando, para outros aspectos nela articuláveis, tais como interrogatividade, retórica e dialéctica, é querer esconjurar uma relação que foi sempre precária, menor e neglicenciada, voluntária ou involuntariamente, quer na abordagem de uma teoria da argumentação quer, por igual medida, na de uma concepção da ironia. As razões para esta desvirtuação são sobejamente conhecidas e prendem-se todas, grosso modo, com a hegemonia asfixiante imposta por um modelo de racionalidade, invocado por uma auto-fundamentação rigorosa, que se tornou emblematicamente monograma e monarquia do pensar filosófico, o que conduziu a uma progressiva desvalorização e secundarização de todos os domínios do saber que não correspondessem à linhagem desse saber proposicionalista, hiper-verificado logicamente, garantindo um grau de consistência sólida a toda a prova.
Na orla desse núcleo endurecido e petrificado, dispunham-se todos os saberes secundários, que sobreviviam nas penumbras inquietas da inquisitorial actividade de um pensar filosófico, augustamente desenvolvido, perante o qual se exerciam subditamente sub-racionalidades, que traziam no seu seio a fragilidade e a inconsistência de um pensamento incapaz de se guindar a essa solidez. De facto, o exercício paradigmático de uma racionalidade cujo movimento auto-constituinte se dá na própria oposição e degradação gnoseológica da noção de argumento, cuja probabilidade deve ceder à provacidade, como é o caso da concepção platónica, faz inscrever na filosofia uma ilusão, uma cegueira da qual se alimentará até à exaustão e que só poderá ser acompanhada pela respectiva degradação ontológica do sensível e do contingente, devido à hiper-valorização extasiante e mística do metafí-sico.
É no âmago deste estigma, rapidamente alastrante e congenitamente permeável nas múltiplas posturas filosóficas, cuja última evidência ainda é o positivismo lógico, e que se traduz nas sucessivas e obsessivas “eugenias”de pensamento fundamentante e fundamental e, por tal, exclusivo de todas as outras formas, metodologica e contextualmente, de pensar, reduzidas a passos em falso e a miniaturas acessórias, quando não inúteis e, por isso, des-filosóficas de pensar; é portanto, no seio deste estigma que se vêm incluir a ironia e a argumentação.
Ironia E Argumentação
- Comunicação, Filosofia
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