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Por meio da interseção entre as distopias do século XX e a utopia de Francis Bacon (Nova Atlântida, 1626) pretendemos analisar alguns aspectos éticos presentes no desenvolvimento tecnocientífico da contemporaneidade.
Autores e estudiosos dessas narrativas ficcionais vão acusar a obra baconiana de possuir em gênese as ideias que se desdobrariam nas distopias da primeira metade do século passado, símbolos de alerta ao avanço da tecnologia e do autoritarismo nos períodos de Guerra Mundial. Todavia, o desenvolvimento do método experimental-indutivo, bem como a interpretação de Bacon sobre o mito de Dédalo, nos mostra que o Lorde Chanceler tinha consciência que a progressão da ciência possuía aplicações positivas e negativas.
Bacon insistiu em sua utopia que a Casa de Salomão, locus político e científico da sociedade na Nova Atlântida, tinha como função guardar os instrumentos de luxúria e morte, da população comum. Sob a liderança dos homens de ciência, e com vistas ao máximo benefício da comunidade (Commonwealth) e do bem da humanidade (Caritas), a sociedade de Bensalém (cidade da Nova Atlântida) poderia exercer o conhecimento-domínio sob a natureza, restabelecendo os laços com o Criador, rompidos desde a Queda. Todavia, o esvaziamento de um ideal condutor e a não compreensão total
O título Admirável Nova Atlântida é uma fusão do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley e da Nova Atlântida de Francis Bacon. Tanto Bacon quanto Huxley, ao construírem suas sociedades a propósito da questão tecnocientífica e do controle social, alcançam resultados complemente diversos; o que se configura na obra de Huxley, uma distopia, e na de Bacon, uma utopia.
Aliás, a obra de Huxley é o melhor exemplo de controle dos itens tecnocientíficos pelo Estado ou organizações maliciosas. O controle que as Industrias Fordistas fazem sobre a população – os bebês de proveta geneticamente condicionados e o narcótico soma – são exemplos tácitos do que foi explicitado anteriormente.
Sendo a Nova Atlântida um dos resultados da filosofia de Francis Bacon, cabe-nos questionar novamente se a promessa do programa baconiano, exemplificado em sua utopia, realmente se mostrou uma ameaça ao ser efetivada?
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