Flora Süssekind – Tal Brasil, Qual Romance? Uma Ideologia Estética E Sua História: O Naturalismo
A noção de naturalismo como sinônimo de documentalismo começa a se esboçar na obra crítica de Flora Süssekind no início da década de 1980 com a publicação de sua dissertação de mestrado, orientada por Silviano Santiago, embora inegavelmente já com voz própria no âmbito de uma nova crítica ativa tanto na universidade quanto no jornalismo.
Do mesmo modo que ocorre na década de 1920 com o “modernismo heroico” brasileiro, o naturalismo – visto de modo estreito pelos seus arautos como meramente mimético, como cópia do real – é tomado pela ensaísta carioca como um mal a ser superado pelas mesmas razões que as vanguardas históricas o fizeram: tratava-se de combater no campo estético a ideia de representação literária enquanto “semelhança”, “unidade especular”, imitação da realidade.
Assim, o alvo era (e é) todo o tipo de realismo lucaksiano entendido como representação “fidedigna” da realidade, em que a ficção comportaria como um autêntico documento que atesta a veracidade dos fatos narrados.
A fim de enfrentar esta “ilusão”, Flora Süssekind lança mão das ideias de “fratura” e de “ruptura pela diferença”, conforme as primeiras páginas de Tal Brasil, Qual Romance?, que na sequência do texto se repetirão como tais ou com o uso de termos similares como “corte”, “desvio” e “fragmentação”.
O fato de o título de sua dissertação apresentar uma interrogação aponta para o próprio gênero escolhido para desenvolvê-la, o ensaio, que se caracteriza, como é sabido, pelo privilégio da visão autoral em nome do questionamento dos objetos em estudo.
Aponta também ao “tal qual” típico da tradição paternalista ocidental, traduzido como herança e reconhecimento mútuo, contra a qual arremete do início ao fim do texto, insuflada simultaneamente pela vanguarda brasileira – com sua reivindicação do matriarcado e da posse contra a propriedade – e pela “neo-vanguarda” da década de 1960 – com as lutas feministas e a liberação dos costumes.
Aponta ainda para a problematização da própria identidade nacional enquanto algo homogêneo e indiscutível.