Imagine um Groucho Marx que, em pleno Brasil dos anos 1920, 1930 e 1940, tivesse seu próprio jornal, no qual se mostrasse sempre pronto a ridicularizar magnatas da imprensa, a atormentar presidentes e a debochar de literatos pretensiosos. Apparício Torelly, que se autoagraciou com o título de Barão de Itararé, foi tudo isso e muito mais. Espírito anárquico a desafiar os anos mais sombrios da Era Vargas, revolucionou o humorismo com seu semanário A Manha. Encarnando o personagem do Barão, confundiu vida e arte, protagonizando histórias que se incorporaram ao folclore político do país. Entre sem bater – A vida de Apparício Torelly, o Barão de Itararé surpreende e comove ao traçar um painel de meio século de história do Brasil pelos olhos de um de seus maiores humoristas.
Fernando Apparício de Brinkerhof Torelly, filho de João da Silva Torelly e de Maria Amélia Brinkerhof Torelly, nasceu em 29 de janeiro de 1895. O local exato seria, anos depois, tema de controvérsias intermináveis, não apenas entre admiradores do humorista como entre vereadores e prefeitos, ansiosos por reivindicar para suas cidades o privilégio de ser berço de Apporelly – a começar pela cidade de Rio Grande, onde seus pais moravam. Porém, ao ser questionado sobre seu local de nascimento, o humorista dizia que viera ao mundo a bordo de uma diligência, em algum lugar no Uruguai.
Seu pai, João da Silva, era brasileiro; a mãe, Maria Amélia, uruguaia. Na iminência de ter seu primeiro filho, a esposa insistiu com o marido para que o parto acontecesse na fazenda de seus pais, no departamento uruguaio de Treinta y Tres. O local era ermo e o vilarejo mais próximo, Pueblo Vergara, ficava a cerca de 40 quilômetros. O pai de Maria Amélia era norte-americano e chamava-se John Brinkerhof. A mãe, Francesca, era descendente de índios que habitavam o Uruguai e o sul do Brasil. Somada à ascendência italiana dos Torelly, as origens variadas coloriam a árvore genealógica do humorista, algo de que se vangloriava, dizendo:
“Sou uma autêntica Liga das Nações.”