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O setor elétrico brasileiro passou por mudanças profundas nas duas últimas décadas. Inscrita na Constituição de 1988, a liberalização do mercado elétrico foi deslanchada no século passado, porém, interrompida neste século.
A liberalização mudou radicalmente o papel do Estado na gestão do mercado elétrico. As concessionárias estatais foram desverticalizadas e, boa parte delas, privatizadas; o regime tarifário pelo custo do serviço foi substituído pelo regime de preços competitivos.
A gestão de riscos, especialmente o hidrológico, tornou-se variável central na busca da melhoria da eficiência econômica empresarial e, consequentemente, da setorial.
A teoria econômica nos sugere que as inovações tecnológicas desempenham papel central na melhoria da eficiência econômica. No modelo monopolista estatal, as concessionárias elétricas ocupavam papel determinante no processo de inovação do setor elétrico.
Ainda que boa parte das inovações tecnológicas tivesse sua origem no parque de fornecedores das concessionárias, eram estas últimas que, atuando cooperativamente, determinavam as trajetórias tecnológicas a serem perseguidas por seus fornecedores de equipamentos e serviços.
Em 1974, o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel) foi criado com a missão de coordenar o esforço inovador das concessionárias brasileiras. Porém, as dificuldades impostas pela década perdida limitaram seu potencial inovador.
A liberalização do mercado elétrico criou um novo ambiente. Em regime concorrencial, as concessionárias tornaram-se avessas aos riscos das inovações.
Os fundos setoriais procuraram mitigar esse problema criando a obrigação legal de as concessionárias destinarem 1% de sua receita operacional líquida para investimentos em projetos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico.
Repartidos entre projetos orientados para soluções de curto e de longo prazo, esses recursos deveriam induzir uma onda inovadora que melhoraria significativamente o desempenho econômico-financeiro do setor elétrico brasileiro. Infelizmente, essa expectativa está longe de se realizar.
Pelo contrário, o que assistimos é a uma deterioração brutal da eficiência econômica setorial, apesar de serem expressivos os recursos pelos fundos setoriais destinados às inovações no setor elétrico. O livro nos ajuda a identificar as raízes desse paradoxo.
O Cepel, apesar dos esforços de sua direção, não consegue exercer papel ativo na coordenação das inovações setoriais. O governo contingencia recursos destinados a inovações de riscos elevados, essenciais para a solução de problemas de longo prazo.
Na ausência de uma estratégia cooperativa orientada para a melhoria da eficiência econômica setorial, as concessionárias alocam os recursos colocados à sua disposição à solução de seus problemas individuais.
O setor elétrico brasileiro apresenta especificidades que necessitam ser contempladas no esforço inovador das concessionárias e dos seus fornecedores de equipamentos e serviços.
O livro de André Furtado preenche uma lacuna importante do nosso conhecimento do setor elétrico: seu processo inovador. Ele sugere a necessidade de mais estudos acadêmicos nesse tema, especialmente no que concerne à análise crítica da alocação dos recursos disponíveis para inovações tecnológicas setoriais.
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