
Originalmente apresentado como tese de doutoramento à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Walnice Nogueira Galvão respondeu ao desafio permanente que o Grande Sertão – Veredas, de Guimarães Rosa, representa para a exegese literária, com a notável leitura crítica de As Formas Do Falso, onde capta todos os fios e deslinda as principais pistas da ambiguidade ficcional de um discurso oral que é escrito, sertanejo ao mesmo tempo que erudito, lúcido enquanto apanha o processo e mitologizante quando o feudaliza, identificado ao homem pobre do sertão e dele distanciado.
As Formas Do Falso é preciso quando historia a ocupação do sertão brasileiro e o desenvolvimento da pecuária e da cultura do gado, sobretudo em sua compreensão de que a ocupação do sertão é um episódio da expansão do capital.
A autora evidencia as articulações existentes entre o processo de colonização e a formação das estruturas sociais do país, em especial aquelas responsáveis pela criação do exército de reserva de homens livres pobres, dependentes dos senhores de terra.
A lógica do capital determinou que as melhores terras, as litorâneas e férteis, fossem reservadas para a lavoura da cana; a produção do açúcar, baseada no braço escravo, ocupa a posição de empreendimento prioritário que determina a posição de todos os demais. Mas, para que a produção do açúcar fosse possível, era preciso garantir a subsistência de todas as pessoas envolvidas no processo produtivo e em sua comercialização: e essa é a razão da criação de gado.
Observando o caráter capitalista do processo que formou o sistema vigente no sertão, Walnice identifica e até mesmo critica a tendência de muitos estudiosos em fazer analogias entre o sertão e o mundo feudal, processo que ela mesma chama de “medievalização do sertão”.
A argumentação da autora não deixa dúvidas quanto à sua consciência do equívoco que é considerar a economia sertaneja uma economia feudal.
