As conferências sobre o tema guerra aérea e literatura apresentadas neste volume não estão publicadas exatamente na forma em que foram proferidas na Universidade de Zurique no final do outono de 1997. A primeira conferência partia da descrição feita por Carl Seelig de uma excursão que realizara com o paciente psiquiátrico Robert Walser em meados do verão de 1943, precisamente no dia anterior à noite em que a cidade de Hamburgo foi arrasada pelo fogo. As reminiscências de Seelig, que não fazem nenhuma alusão a essa coincidência fortuita, levaram-me a compreender com maior clareza a perspectiva sob a qual eu mesmo encaro os horríveis acontecimentos daquele ano. Nascido em maio de 1944 num vilarejo dos Alpes do Allgau, faço parte daqueles que não foram atingidos diretamente pela catástrofe que então se consumava no Reich alemão. Por meio de passagens mais longas dos meus próprios trabalhos literários, eu tentei mostrar na conferência que essa catástrofe, mesmo assim, deixara vestígios na minha memória. Em Zurique, isso se justificava na medida em que eu deveria ali, de fato, falar sobre poética. Na versão ora apresentada, no entanto, extensas autocitações não teriam cabimento. Por isso, retomei apenas algo da primeira palestra para um postseriptum, que trata, no mais, das reações provocadas pelas conferências de Zurique e da correspondência que recebi em seguida, muitas vezes de caráter um tanto bizarro. Mas, justamente pela natureza deficiente e forçada desses textos e cartas a mim enviados, podia-se perceber que aquilo que milhões vivenciaram nos últimos anos da guerra, uma humilhação nacional sem precedente, nunca foi realmente traduzido em palavras, não tendo sido nem compartilhado entre os diretamente atingidos, nem transmitido por eles aos que nasceram depois. A queixa sempre repetida de que até hoje não foi escrita a grande epopeia alemã da guerra e do pós-guerra tem algo a ver com esse fracasso (de certo modo, inteiramente compreensível) diante da violência que representa a absoluta contingência gerada por nossas cabeças obsessivamente metódicas. Apesar do árduo esforço empenhado no que se convencionou chamar de superação do passado, parece-me que nós, alemães, somos hoje um povo estranham ente cego para a história e despojado de tradição. Não temos um interesse apaixonado pelas nossas antigas formas de vida nem pelas especificidades de nossa própria civilização, como se nota, por exemplo, em toda a
cultura da Grã-Bretanha.
Guerra Aérea E Literatura
- História, Letras, Literatura
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