
Thássio Ferreira – Itinerários
A poesia de Thássio Ferreira traça itinerários instigantes, aponta caminhos, desdobra-se em veredas, compõe paisagens… por vezes, estradas a céu aberto… outras vezes, labirintos da alma emoldurados pelo tempo e pelo silêncio.
São itinerários onde muitos de nós, seus leitores e leitoras, nos encontramos, nos contemplamos, nos espantamos, e, por fim, tomamos fôlego (e um gole a mais de coragem) para prosseguirmos nossos descaminhos.
O poeta traça improváveis geografias (muitas!), entre assonâncias, aliterações, metáforas, neologismos e rimas imprevisíveis. Ora a traçar mapas sensoriais, ora a gravar contornos de vozes – em princípio, inaudíveis –, ora a provocar delírios no cúmplice leitor.
Sua poesia busca grafar “o desenho do espaço sem limites” e nos impulsiona a percorrer versos, saltar abismos, navegar “rasgando a pele das águas”…
Nesse denso percurso, que requer mergulho, imersão, bravura – coisa de quem se pretende aventureiro da palavra e do mundo para cumprir seus itinerários – encontramos rios inundados de dor e saudades, matas, noites, outras línguas, precipícios, amor de pai, “calor de mãe/colo de sol”.
São poemas que nos (e)levam a(o) pensar sobre “solidão/peso de vida/que pulsa” no “mundo com suas imperfeições/ de chuvas e guerras”. Ao pisar esses (des)caminhos – (a)fora e (a)dentro – guiados pelas palavras do poeta, como ele, tentamos “saber se é possível/ser apenas para dentro./sem ser para o mundo”.
Ao percorrer o livro, atravessamos mares, ruas, desassossegos e memórias, viajamos para dentro de um “fundo sem fundo”, como versara Gullar, que é a própria linguagem e a existência; ambas indissociáveis, já que somos seres constituídos pela e na linguagem, como alerta Bakhtin.
E nessas águas de imensuráveis possibilidades que são a literatura, o poeta questiona o universo como quem questiona o próprio existir e seus espantos.
Ao tomar “o céu como exemplo”, pergunta-se: “como se aguenta, espraiado/sem se esfacelar?”. E perturba-se com “o mundo” e seus “erros irreparáveis/e as dores sem cura/sem fuga e sem muros”.
Mas, para além do assombro que é o próprio viver, o poeta também evoca a beleza de “nuvens moles sobre o mar de outono” e nas lâminas de manhãs azuis cria e traduz lindezas com seu “sêmen rubro/a fecundar calores/no ventre aflito/dos oceanos”.
E se em meio a tanta beleza há “um silêncio pedra/queimando as vozes do não-dito” há também um desejo de “nascer da pedra/e da pedra florir”, já que em seus poemas “todo existir/é vencer a pedra/ em precipício”.
Sua poesia é repleta de silêncios e vozes… vozes amalgamadas, ancestrais ou desconhecidas, que compõem o eu lírico e onírico do poeta; vozes que remetem, uma vez mais, à filosofia bakhtiniana.
