Diante Da Dor Dos Outros
– Imagens do sofrimento são apresentadas diariamente pelos meios de comunicação. Graças à televisão e ao computador, imagens de desgraça se tornaram uma espécie de lugar-comum. Mas como a representação da crueldade nos influencia? O que provocam em nós exatamente? Estamos insensibilizados pelo bombardeio de imagens?
Em Ensaios sobre a fotografia, publicado no Brasil no começo dos anos 1980, Susan Sontag abordou o tema em termos que definiram o debate pelas décadas seguintes. Aqui, faz uma nova e profunda reflexão sobre as relações entre notícia, arte e compreensão na representação dos horrores da guerra, da dor e da catástrofe.
Discutindo os argumentos sobre como essas imagens podem inspirar discórdia, fomentar a violência ou criar apatia, a autora evoca a longa história da representação da dor dos outros – desde As desgraças da guerra, de Francisco de Goya (1746-1828), até fotos da Guerra Civil Americana, da Primeira Guerra Mundial, da Guerra Civil Espanhola, dos campos nazistas de extermínio durante a Segunda Guerra, além de imagens contemporâneas de Serra Leoa, Ruanda, Israel, Palestina e de Nova York no 11 de setembro de 2001.
Num texto preciso e provocador, Sontag levanta questões cruciais para a compreensão da vida contemporânea. De sua reflexão surge uma formulação surpreendente e desafiadora: a relevância dessas imagens depende, em última instância, da maneira com que nós, espectadores, as encaramos.
Em junho de 1938, Virginia Woolf publicou Três guinéus, suas corajosas e mal recebidas reflexões sobre as raízes da guerra. Escrito no decorrer dos dois anos precedentes, enquanto ela e a maioria de seus amigos íntimos e de seus colegas escritores tinham as atenções voltadas para o avanço da insurreição fascista na Espanha, o livro foi concebido como uma resposta muito tardia a uma carta de um eminente advogado de Londres que perguntara: “Na sua opinião, como podemos evitar a guerra?”. Woolf começa por observar, com mordacidade, que entre eles dois talvez não seja possível um diálogo autêntico.
Pois, embora pertençam à mesma classe, “a classe instruída”, um vasto abismo os separa: o advogado é homem e ela é mulher. Homens fazem a guerra. Homens (em sua maioria) gostam de guerra, pois para eles existe “uma glória, uma necessidade, uma satisfação em lutar” que as mulheres (em sua maioria) não sentem ou não desfrutam. O que uma mulher instruída — leia-se: rica, privilegiada — como ela sabe sobre guerra? Pode sua repulsa ao fascínio da guerra ser como a dele?