Um estranho numa terra estranha
é considerado, e costuma ser descrito dessa forma, o arquétipo de um romance de ficção científica dos anos 1960.
Afinal de contas, ele não foi de fato uma parte essencial da contracultura da época? Não contém filosofias e modos de vida que as pessoas tentaram incorporar no cotidiano? Não ajudou a criar a onda do pensamento e do amor livres?
Bem, sim. Mas suas atitudes, e a época do texto, estão solidamente enraizadas nos anos 1950.
Quando escreveu o Estranho, Robert A. Heinlein era o mais importante autor dos “juvenis de FC”, livros de ficção científica voltados para jovens leitores, nos Estados Unidos (os marcianos e o planeta Marte de Estranho tiveram sua origem, na verdade, em um livro juvenil de 1949, chamado O planeta vermelho). Heinlein queria escrever um romance que fosse “adulto”, e que faria dele muito mais do que um autor de livros juvenis. Então decidiu mirar em questões que teria sido impossível tratar em romances para jovens
leitores: seus alvos seriam o monoteísmo e a monogamia.
Valentine Michael Smith, o herói de Estranhoé como o Mogli de Kipling, mas foi criado não por lobos e outros animais da floresta, e sim por “Anciãos” marcianos. Smith vê as coisas como um marciano as veria, compreende os eventos como um marciano o faria. Ele precisa aprender o que é ser humano e, como os marcianos lhe dão habilidades e poderes muito além da norma dos terráqueos, precisa aprender o que significa ser mais do que humano.
O mundo de Estranho é fundamentalmente o dos anos 1950. Claro, contraceptivos orais — “as pastilhas malthusianas” — existem, mas são panaceia de charlatões. Táxis voam sem motoristas, jornais são lidos em telas nas quais o texto flui, e a televisão é 3D, mas esse é um mundo de megaigrejas e atrações de circo, em que as relações sociais entre homens e mulheres são as mesmas de muito tempo atrás. (Mas, diabos, essas relações podem até mesmo voltar a valer. A história se repete, e o mesmo acontece com as atitudes sociais).
Publicado em 1961, o livro, assim como as filosofias e atitudes nele presentes, causaram um efeito imenso nos anos 1960. Estranho alimentou a contracultura.