René Girard – O Bode Expiatório
Édipo é expulso de Tebas como responsável pela peste que se abate sobre a cidade. A vítima está de acordo com seus carrascos. A infelicidade apareceu porque ele matou seu pai e casou-se com sua mãe.
O bode expiatório supõe sempre a ilusão persecutória. Os carrascos creem na culpabilidade de suas vítimas; estão convencidos, no momento da aparição da peste negra no século XIV, de que os judeus envenenaram os rios.
A caça às bruxas implica que juízes e acusadas creem na eficácia da bruxaria. Os evangelhos gravitam ao redor da paixão como todas as mitologias do mundo, mas a vítima rejeita todas as ilusões persecutórias, recusa o ciclo da violência e do sagrado.
O bode expiatório torna-se o cordeiro de Deus. Assim é destruída para sempre a credibilidade da representação mitológica. Permanecemos perseguidores, mas perseguidores vergonhosos.
Toda violência doravante revela o que a paixão de Cristo revela: a gênese imbecil dos ídolos sangrentos, de todos os falsos deuses das religiões, das políticas e das ideologias.
A relação entre violência e fundação é um dos dois grandes pontos de discussão da obra do crítico e antropólogo francês René Girard, que também poderia ser chamado de filósofo do desejo e da violência.
Ao investigar a fundação das culturas arcaicas, Girard propõe a hipótese do mecanismo do bode expiatório.
O bode expiatório seria uma vítima inocente que, num grupo de hominídeos pré-históricos assolado por rivalidades e por disputas, consegue unir o grupo, que a mata num linchamento.
Esse grupo, após descontar sua violência sobre a vítima, sente-se apaziguado, e assim passa a enxergar nela alguém capaz de desestabilizá-lo e de restabilizá-lo. Seria esse o motivo de a vítima ser divinizada.
Para Girard, os ritos são a tentativa de reencenar esse linchamento original, e os mitos são narrativas feitas desde o ponto de vista dos linchadores, que pretendem justificar a violência contra aquela vítima.
É fundamental para o funcionamento do mecanismo que se creia que o bode expiatório é culpado, isto é, que ele não é apenas um bode expiatório.

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