
Na era pós-globalização, o retorno do nacionalismo, a manifesta argúcia do populismo e o pendor protecionista dos regimes políticos do Ocidente parecem constituir a resposta imediata das sociedades domésticas ao desafio que lhes tem sido colocado pelo crescente fluxo transnacional de pessoas.
Sobretudo pela migração forçada – causada por perseguições religiosas, políticas, guerras, alterações climáticas, etc – que incita não só as práticas de democracia e cidadania e os seus respectivos valores no contexto do Estado-nação, como a própria capacidade de resposta da comunidade internacional a cenários de déficits de direitos humanos como os proporcionados pelas crises humanitárias.
É desconcertante que, em pleno século XXI, qualquer indivíduo do mundo não possa usufruir integralmente do seu direito à liberdade de movimento, sobretudo em casos de subsistência e segurança; vendo-se bloqueado por fronteiras territoriais, políticas de admissão e inclusão assentes nos interesses dos Estados-nação e dos seus cidadãos, a cada dia mais restritivas.
Ainda mais desconcertante é, certamente, que as vítimas de crises humanitárias, cujos direitos humanos foram desrespeitados, padeçam duplamente pela suspensão do seu direito a ter direitos.
Como sublimado por Seyla Benhabib em The Rights of Others, o direito do indivíduo a ter direitos, ou de pertença à humanidade, deve ser garantido pela humanidade em si mesma e independentemente da sua cidadania nacional.
Neste sentido, a proteção de direitos reivindicados pelos membros da comunidade humana constitui um dever moral que, hoje amplamente reconhecido pelo regime internacional, mantém-se na esfera de incumbências dos Estados soberanos – no seio dos quais se adensa a tensão constitutiva da legitimidade democrática, entre as reivindicações, por um lado, dos direitos humanos e, por outro lado, das culturas particulares e identidades nacionais.
Como evidenciado ao longo de Direitos Humanos E Migrações, hoje revela-se imprescindível repensar ética e politicamente as questões relativas à liberdade de movimento transnacional de pessoas, especialmente o fato de reconhecermos ou não essa liberdade como um direito humano e o ônus que, em virtude desse dilema, recai sobre os Estados soberanos como membros da comunidade internacional.
