
As “[…] políticas globais não estão isentas de valores, nem ocupam espaços vazios”. Esta frase, do meu ponto de vista, é a principal justificativa para esse trabalho de fôlego de Marcia Guedes Vieira e da excelência da contribuição não só no campo das Ciências Sociais brasileiras, mas também para a compreensão da problemática que está presente hoje em todos os países do mundo: o trabalho infantil.
Todo tema complexo, como é o trabalho infantil, requer a conjugação de diferentes níveis de análise e a articulação de diversos campos do saber. Assim se apresentam os desafios de fazer pesquisa em diversas escalas, em múltiplas dimensões e com variedade de atores envolvidos.
Dessa forma, a autora maneja com maestria a interdisciplinaridade não só na utilização das categorias conceituais, mas também na conjugação de diversas técnicas de pesquisa.
Ela consegue correlacionar as escalas local/global, as dimensões sociais, culturais e políticas e os diferentes atores/gestores do processo. Esse desafio requer do pesquisador uma expertise especial para “olhar, ouvir e escrever” com a devida adequação acadêmica.
A análise da implementação de uma política global tão significativa como o Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (Ipec) da OIT nos dá uma perspectiva de temporalidade importante nos estudos atuais sobre o tema.
O contexto local brasileiro está em franca mudança. As ideias e ideais sobre o segmento infanto-juvenil presentes nos atuais discursos dos escalões da gestão pública dão indícios de formação de uma nova compreensão sobre o tema e um retorno a concepções já superadas por gestões anteriores.
Dessa forma, este livro traz uma perspectiva sócio-histórica essencial não só para a academia, mas também para as concepções de futuras políticas públicas, a partir da reconstrução do processo de implementação do Ipec no Brasil e no Paraguai focada na percepção dos atores locais.
O contexto de globalização e de hegemonia do capitalismo neoliberal revigora os debates sobre esta problemática. Em um mundo globalizado, articular as diferentes escalas de análises – nacional e global – traz um desafio a mais para o pesquisador, porém absolutamente necessário.
Sem estar atento às diversas dimensões que incidem sobre as problemáticas culturais e sociopolíticas de cada país, os estudos sobre políticas globais, principalmente no campo dos direitos humanos, não alcançariam as dinâmicas, as interações e as mútuas influências que permeiam as relações entre o local e o global.
Além disso, a metodologia comparativa proposta neste livro avança ainda mais na busca de elucidações recíprocas e de reflexões mais densas e profundas.
