
Patrimônio cultural tornou-se categoria central da hipermodernidade. Confunde-se, hoje, com vínculo social. É uma espécie de metonímia da identidade cultural: o monumento como contiguidade material do território; os fragmentos de um sítio como parte de um todo maior, da coletividade, do gueto ou da “comunidade imaginada”.
Devemos perguntar, como os autores deste segundo volume de Patrimônio Cultural, Direito e Meio Ambiente, sobre a genealogia desse processo que fez do patrimônio cultural significante da autorrepresentação.
Os estudos sobre patrimônio cultural, realizados pelas mais diversas áreas, cresceram exponencialmente desde 1990. Numa perspectiva externalista, isso se deve, sem dúvidas, aos eventos posteriores a 1989, com a Queda do Muro de Berlim e a Guerra Civil na Iugoslávia (1991-2001).
Nessa linha, devem-se considerar, também, os diversos conflitos nas áreas “descolonizadas” da África e da Ásia e a abertura democrática na América do Sul. Em primeiro lugar, todos esses eventos evidenciaram, para o mundo, o ressurgimento dos espectros que levaram à eclosão das duas Guerras Mundiais: o nacionalismo e o colonialismo.
A visão normativa de patrimônio é, hoje, confrontada pela noção de que o passado, nas palavras de David Lowenthal, é um “país estrangeiro”, um lugar heterotópico onde dificilmente vicejará o consenso sobre os processos de representação cultural.
Chega-se mesmo a afirmar, como o faz Cornelius Holtorf, que destruição não é antítese de patrimônio cultural. O patrimônio cultural, permanentemente exposto às diversas concepções nativas, molda-se na fôrma da autoidentificação cultural.
Ele não é ativado somente como sinal diacrítico a diferenciar nações e grupos étnicos, mas, sobretudo, é usado para agir, para interferir nas redes e circuitos de poder. Por isso, o patrimônio cultural nunca se dissocia das políticas de representação e dos debates sobre diversidade cultural.
O mérito deste segundo volume de Patrimônio Cultural, Direito E Meio Ambiente é exatamente o de ilustrar os meandros desses debates.
Os diversos autores do livro congregam reflexões críticas sobre as tramas e mecanismos que fizeram do patrimônio cultural categoria central do mundo globalizado. Leitores e leitoras, desse modo, poderão refletir sobre como visões normativas do patrimônio cultural deram lugar à diversidade cultural, valor ainda a ser conquistado na hipermodernidade.

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