
Os grandes meios de comunicação costumam se apresentar como veículos isentos e neutros, trazendo em suas narrativas os fatos mais relevantes e fundamentados.
Contudo, uma análise mais atenta sobre a maneira como os assuntos são abordados, ou a falta deles; a interpretação que se dá aos mesmos; as palavras que são usadas ou omitidas, enfim, o modo como se processa a comunicação indica, entre outras coisas, a intenção, o posicionamento, os interesses que determinado veículo da imprensa tem.
Aconteceu, Virou Manchete escrito por Greyce Falcão e que agora vem a público foi, inicialmente, uma dissertação de mestrado, que buscava entender o posicionamento de uma revista de entretenimento, de circulação nacional e grande tiragem, Manchete, e como a mesma analisava os acontecimentos políticos particularmente no pós ditadura, fazendo a sua defesa.
A autora desenvolveu uma narrativa clara e bem documentada, que foi desde a formação da empresa e sua direção, seu parque gráfico e desenvolvimento, levando em conta as características específicas do seu fundador, Adolpho Bloch, bem como suas simpatias políticas e o papel que exerceu no meio dos setores dominantes.
Por ser um trabalho de história trouxe uma análise fundamentada sobre o período estudado, anos 50 e 60, as disputas políticas e os diferentes projetos que se colocavam para o país.
De um lado, os setores ligados aos interesses dos latifundiários, do grande empresariado nacional e estrangeiro em aliança com as Forças Armadas, e de outro os setores reformistas, interessados na ampliação da participação política dos trabalhadores em busca da construção de um projeto mais voltado aos interesses nacionais.
Essa disputa, que terminou com a ruptura democrática através do Golpe de 1964 e a instauração da ditadura militar que durou até 1985 também foi retratada, trazendo inclusive algumas importantes discussões historiográficas sobre o referido período.
Por fim, e como ponto alto do trabalho, Greyce Falcão faz uma análise criteriosa e ampla das notícias publicadas na Manchete, favoráveis à ditadura, tendo como contraponto o jornal Última Hora, de Samuel Wainer, defensor das reformas e de um projeto democrático.
Aconteceu, Virou Manchete nos dá elementos para entender de maneira crítica e clara de como esses veículos, ao fazerem suas reportagens, tinham presentes sua visão de mundo e seu compromisso com os setores que se propunham representar.
