
Garantir a excelência técnico-científica de uma profissão requer não apenas o bom desempenho de determinada metodologia, mas, igualmente, a articulação dessa práxis com outras áreas de saber e o comprometimento com a dignidade da pessoa humana.
Essas premissas encontram-se exaradas nos códigos de éticas de todas as profissões regulamentadas e constituem o próprio motivo fundacional dos Conselhos Profissionais como autarquias públicas: se, por um lado, estes visam a assegurar a autonomia profissional diante do Estado, por outro, o próprio Estado se lhes exige cumprimento de ações de proteção à sociedade.
Em outras palavras, os conselhos profissionais não se guiam pela mera defesa de interesses classistas e de suas respectivas áreas de conhecimento, mas pretendem, antes, assegurar que a atividade profissional por eles controlada respeite os interesses da sociedade.
Nomear o depoimento como sendo “especial” ou “sem dano” não elimina o dano de tal procedimento. Deve-se evitar que crianças e adolescentes sejam usados como únicos e preponderantes meios de prova em processos penais, bem como lutar para o aperfeiçoamento da investigação processual policial e judicial.
É com esse entendimento que, muitas vezes reunida em Congressos Nacionais, a própria categoria profissional de Psicologia determinou que o Conselho Federal de Psicologia (CFP) não permitisse que psicólogas(os) realizem a inquirição judicial de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, por mais inflexões terminológicas que o procedimento tenha sofrido.
Não porque a classe carecesse de técnicas científicas para extrair informações nem porque não houvesse interesse de inserção desses profissionais no Sistema de Justiça, mas por considerar, precisamente, que a atuação profissional deve atender primordialmente ao código de ética, ter sua autonomia respeitada e, sobretudo, atender a interesses sociais consagrados na própria Carta Magna, como, neste caso, o melhor interesse da criança.
A fronteira entre a ética profissional e as exigências complexas do quotidiano de psicólogas inseridas em variados equipamentos da Rede de Proteção deve ser sempre problematizada.
É preciso discutir o problema das várias formas de violência perpetradas contra crianças e adolescentes, estabelecer políticas públicas efetivas e permanentes que enfrentem essas violências, mas também as previnam e, no âmbito profissional, propiciar discussões que considerem devidamente a técnica científica na perspectiva da promoção dos direitos humanos.
Assim, com o objetivo de proporcionar reflexão sobre o tema no Brasil, o CFP apresenta o histórico de sua atuação frente aos debates sobre a inquirição judicial de Crianças e Adolescentes, uma vez que, para a Psicologia, a escuta de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência deve ser, em qualquer contexto, pautada na doutrina da proteção integral, pela legislação específica da profissão e em marcos teóricos, técnicos e metodológicos da Psicologia como ciência e profissão.
