O Brasil Como Problema

O leitor de O Brasil Como Problema deve adotar uma atitude iconoclasta que muito provavelmente agradaria a seu autor, isto é, deve começar a percorrer este instigante testemunho de um dos mais criativos e inquietos pensadores da cultura brasileira pelo último texto: “Minhas peles”.

O título revelador constitui um convite para o entendimento de sua obra e, sobretudo, do estilo Darcy Ribeiro.
O usual teria sido a escolha de outra voz: máscaras. A noção do emprego de máscaras diversas no trato social é a marca-d’água do moralismo francês, inaugurando um modelo ainda hoje recorrente e que traduz a vida social em termos teatrais, pois todos, conscientemente ou não, representamos inúmeros papéis na sociedade.
Contudo, e de modo sintomático, Darcy escolheu um vocabulário propriamente visceral: peles. Eis um índice preciso para pensar sua vida e obra. Vejamos, ou melhor, escutemos suas palavras:
Meu tema, aqui, sou eu mesmo e devo versá-lo com o gosto que tenho e confesso de falar de mim. Quem sou eu? Às vezes me comparo com as cobras, não por serpentário ou venenoso, mas tão só porque, eu e elas, mudamos de pele de vez em quando. Usei muitas peles nesta minha vida já longa e é delas que vou falar.
Vaidade? Narcisismo? Claro que sim! Mas apenas parcialmente – e essa restrição faz toda a diferença, abrindo caminho para uma leitura radical da diferença Darcy Ribeiro.
Como contraponto à afirmação anterior, tem-se a “Nota do autor à primeira edição”. Nela, o leitor encontra uma advertência prudente:
Mas não se equivoque comigo. Nenhum escritor é inocente, eu também não... Confesso que quero mesmo é fazer sua cabeça. [...] E, apesar de mim, me queira bem.
É bem isto: a força da presença Darcy Ribeiro depende das mesclas – palavra-valise do seu pensamento – incomuns de ingenuidade e autoironia, utopia e autocrítica. Sem essa mestiçagem conceitual, o gosto de falar de si mesmo não seria muito mais do que um traço psicológico.
Esse não é o caso do autor de O Brasil Como Problema em nenhuma circunstância. Trata-se antes de um dilema estrutural que Darcy Ribeiro precisou enfrentar a fim de afirmar sua singularidade como pensador. A melhor maneira de compreendê-lo consiste em surpreender uma constelação similar em outros autores de diferentes contextos, mas irmanados por idêntico impasse.

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O usual teria sido a escolha de outra voz: máscaras. A noção do emprego de máscaras diversas no trato social é a marca-d’água do moralismo francês, inaugurando um modelo ainda hoje recorrente e que traduz a vida social em termos teatrais, pois todos, conscientemente ou não, representamos inúmeros papéis na sociedade.
Contudo, e de modo sintomático, Darcy escolheu um vocabulário propriamente visceral: peles. Eis um índice preciso para pensar sua vida e obra. Vejamos, ou melhor, escutemos suas palavras:
Meu tema, aqui, sou eu mesmo e devo versá-lo com o gosto que tenho e confesso de falar de mim. Quem sou eu? Às vezes me comparo com as cobras, não por serpentário ou venenoso, mas tão só porque, eu e elas, mudamos de pele de vez em quando. Usei muitas peles nesta minha vida já longa e é delas que vou falar.
Vaidade? Narcisismo? Claro que sim! Mas apenas parcialmente – e essa restrição faz toda a diferença, abrindo caminho para uma leitura radical da diferença Darcy Ribeiro.
Como contraponto à afirmação anterior, tem-se a “Nota do autor à primeira edição”. Nela, o leitor encontra uma advertência prudente:
Mas não se equivoque comigo. Nenhum escritor é inocente, eu também não… Confesso que quero mesmo é fazer sua cabeça. […] E, apesar de mim, me queira bem.
É bem isto: a força da presença Darcy Ribeiro depende das mesclas – palavra-valise do seu pensamento – incomuns de ingenuidade e autoironia, utopia e autocrítica. Sem essa mestiçagem conceitual, o gosto de falar de si mesmo não seria muito mais do que um traço psicológico.
Esse não é o caso do autor de O Brasil Como Problema em nenhuma circunstância. Trata-se antes de um dilema estrutural que Darcy Ribeiro precisou enfrentar a fim de afirmar sua singularidade como pensador. A melhor maneira de compreendê-lo consiste em surpreender uma constelação similar em outros autores de diferentes contextos, mas irmanados por idêntico impasse.

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