Histórias De Alexandre

Ainda que em formato e gênero pouco usuais na obra do autor – o conto, a fábula, para um público infanto-juvenil –, Histórias de Alexandre mostra as mesmas preocupações dos outros textos de Graciliano Ramos

: a descrença na justiça e na política; a luta entre as estruturas rurais e arcaicas com as forças urbanas modernizadoras; a denúncia da miséria; a aversão ao capitalismo; a irritação com o uso da linguagem empolada.
Histórias de Alexandre teve a pouca sorte de ser lançado depois de Vidas Secas e pouco antes de Infância, dois grandes sucessos de Graciliano, ficando então à sua sombra e não recebendo da crítica a atenção que merecia, pois é um grande livro.

No sertão do Nordeste vivia antigamente um homem cheio de conversas, meio caçador e meio vaqueiro, alto, magro, já velho, chamado Alexandre. Tinha um olho torto e falava cuspindo a gente, espumando como um sapo-cururu, mas isto não impedia que os moradores da redondeza, até pessoas de consideração, fossem ouvir as histórias fanhosas que ele contava. Tinha uma casa pequena, meia dúzia de vacas no curral, um chiqueiro de cabras e roça de milho na vazante do rio. Além disso possuía uma espingarda e a mulher. A espingarda lazarina, a melhor espingarda do mundo, não mentia fogo e alcançava longe, alcançava tanto quanto a vista do dono; a mulher, Cesária, fazia renda e adivinhava os pensamentos do marido. Em domingos e dias santos a casa se enchia de visitas — e Alexandre, sentado no banco do alpendre, fumando um cigarro de palha muito grande, discorria sobre acontecimentos da mocidade, às vezes se enganchava e apelava para a memória de Cesária. Cesária tinha sempre uma resposta na ponta da língua. Sabia de cor todas as aventuras do marido, a do bode que se transformava em cavalo, a da guariba mãe de família, da cachorra morta por um caititu acuado, pobrezinha, a melhor cachorra de caça que já houve. E aquele negócio de onça-pintada que numa noite ficara mansa como bicho de casa? Era medonho. Alexandre tinha realizado ações notáveis e falava bonito, mas guardava muitas coisas no espírito e sucedia misturá-las. Cesária escutava e aprovava balançando a cabeça, curvada sobre a almofada trocando os bilros, pregando alfinetes no papelão da renda.

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Ainda que em formato e gênero pouco usuais na obra do autor – o conto, a fábula, para um público infanto-juvenil –, Histórias de Alexandre mostra as mesmas preocupações dos outros textos de Graciliano Ramos: a descrença na justiça e na política; a luta entre as estruturas rurais e arcaicas com as forças urbanas modernizadoras; a denúncia da miséria; a aversão ao capitalismo; a irritação com o uso da linguagem empolada.
Histórias de Alexandre teve a pouca sorte de ser lançado depois de Vidas Secas e pouco antes de Infância, dois grandes sucessos de Graciliano, ficando então à sua sombra e não recebendo da crítica a atenção que merecia, pois é um grande livro.

No sertão do Nordeste vivia antigamente um homem cheio de conversas, meio caçador e meio vaqueiro, alto, magro, já velho, chamado Alexandre. Tinha um olho torto e falava cuspindo a gente, espumando como um sapo-cururu, mas isto não impedia que os moradores da redondeza, até pessoas de consideração, fossem ouvir as histórias fanhosas que ele contava. Tinha uma casa pequena, meia dúzia de vacas no curral, um chiqueiro de cabras e roça de milho na vazante do rio. Além disso possuía uma espingarda e a mulher. A espingarda lazarina, a melhor espingarda do mundo, não mentia fogo e alcançava longe, alcançava tanto quanto a vista do dono; a mulher, Cesária, fazia renda e adivinhava os pensamentos do marido. Em domingos e dias santos a casa se enchia de visitas — e Alexandre, sentado no banco do alpendre, fumando um cigarro de palha muito grande, discorria sobre acontecimentos da mocidade, às vezes se enganchava e apelava para a memória de Cesária. Cesária tinha sempre uma resposta na ponta da língua. Sabia de cor todas as aventuras do marido, a do bode que se transformava em cavalo, a da guariba mãe de família, da cachorra morta por um caititu acuado, pobrezinha, a melhor cachorra de caça que já houve. E aquele negócio de onça-pintada que numa noite ficara mansa como bicho de casa? Era medonho. Alexandre tinha realizado ações notáveis e falava bonito, mas guardava muitas coisas no espírito e sucedia misturá-las. Cesária escutava e aprovava balançando a cabeça, curvada sobre a almofada trocando os bilros, pregando alfinetes no papelão da renda.

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