Três Contos

Pode-se retraçar as origens de Um coração simples até a juventude de Flaubert. Numa carta escrita do Oriente, ele menciona a ideia de escrever a história de uma moça flamenga, virgem e mística, recolhida na província; e algo disso aparece em Madame Bovary, na pessoa da velha Catherine Leroux.

Por outro lado, a biografia rasa da protagonista do conto responde a outra ambição longamente acalentada por Flaubert: escrever sobre quase nada, sem o apoio de um enredo encorpado. O conto começa, justamente, por uma frase lapidar, que adianta quase todo o resto e não deixa grande espaço para reviravoltas: assistiremos, em resumo, ao meio século de servidão de Félicité, pontuado por perdas sucessivas. Mais que se desenrolar, a história se extingue.
A legenda de São Julião Hospitaleiro remonta à meninice do autor, que podia ver a história do santo parricida representada num dos mais belos vitrais da catedral de Rouen. Pouco depois de publicar Madame Bovary, Flaubert chegou a tomar notas e a esboçar um plano para um conto sobre o tema, que entretanto teve de esperar quase vinte anos para voltar à escrivaninha. A legenda flaubertiana apresenta-se desde o título como tal, isto é, como hagiografia, relato do caminho pelo qual um homem se torna um santo.
Herodíade, por sua vez, guarda fortes semelhanças com Salammbô: o tema é outro, mas as personagens “são da mesma raça e o ambiente é mais ou menos o mesmo”, como escreveu o autor. Mas, em 1876, o romance cartaginês de 1862 é menos um modelo do que um alerta; Flaubert teme recair nos mesmos efeitos e faz de tudo para que o conto não desmorone sob o peso da arqueologia. O resultado, de fato, é em tudo diverso: Herodíade parece escrito sob o signo do presente. Presente cênico, quase aristotélico: respeita-se aqui a unidade de tempo, de lugar e de ação, a qual começa na iminência da catástrofe; são ainda as falas das personagens que respondem pelo caminhar da ação; e o narrador não hesita em alterar as datas de acontecimentos históricos, de modo que coincidam com o drama na cidadela de Maqueros.

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Pode-se retraçar as origens de Um coração simples até a juventude de Flaubert. Numa carta escrita do Oriente, ele menciona a ideia de escrever a história de uma moça flamenga, virgem e mística, recolhida na província; e algo disso aparece em Madame Bovary, na pessoa da velha Catherine Leroux. Por outro lado, a biografia rasa da protagonista do conto responde a outra ambição longamente acalentada por Flaubert: escrever sobre quase nada, sem o apoio de um enredo encorpado. O conto começa, justamente, por uma frase lapidar, que adianta quase todo o resto e não deixa grande espaço para reviravoltas: assistiremos, em resumo, ao meio século de servidão de Félicité, pontuado por perdas sucessivas. Mais que se desenrolar, a história se extingue.
A legenda de São Julião Hospitaleiro remonta à meninice do autor, que podia ver a história do santo parricida representada num dos mais belos vitrais da catedral de Rouen. Pouco depois de publicar Madame Bovary, Flaubert chegou a tomar notas e a esboçar um plano para um conto sobre o tema, que entretanto teve de esperar quase vinte anos para voltar à escrivaninha. A legenda flaubertiana apresenta-se desde o título como tal, isto é, como hagiografia, relato do caminho pelo qual um homem se torna um santo.
Herodíade, por sua vez, guarda fortes semelhanças com Salammbô: o tema é outro, mas as personagens “são da mesma raça e o ambiente é mais ou menos o mesmo”, como escreveu o autor. Mas, em 1876, o romance cartaginês de 1862 é menos um modelo do que um alerta; Flaubert teme recair nos mesmos efeitos e faz de tudo para que o conto não desmorone sob o peso da arqueologia. O resultado, de fato, é em tudo diverso: Herodíade parece escrito sob o signo do presente. Presente cênico, quase aristotélico: respeita-se aqui a unidade de tempo, de lugar e de ação, a qual começa na iminência da catástrofe; são ainda as falas das personagens que respondem pelo caminhar da ação; e o narrador não hesita em alterar as datas de acontecimentos históricos, de modo que coincidam com o drama na cidadela de Maqueros.

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