A Tentação Do Impossível: Victor Hugo E Os Miseráveis

O personagem principal de Os miseráveis não é monsenhor Bienvenu, nem Jean Valjean, nem Fantine, nem Gavroche, nem Marius, nem Cosette, mas sim aquele que os conta e inventa, um narrador linguarudo que surge continuamente entre as suas criaturas e o leitor.

Presença constante, arrebatadora, a cada passo ele interrompe o relato para opinar, às vezes em primeira pessoa e sob um nome que quer nos fazer acreditar é o próprio Victor Hugo, sempre em voz alta e cadenciada, para interpolar reflexões morais, associações históricas, poemas, lembranças íntimas, para criticar a sociedade e os homens em suas grandes intenções ou suas pequenas misérias, para condenar seus personagens ou elogiá-los. Volta e meia ele nos afirma que é apenas um obediente escriba de uma história anterior ao romance, real como a vida e verdadeira como a própria verdade, que precede, anula e transcende a ele, simples intermediário, mero copista do real. Que conversa fiada! Na verdade, ele é o astuto fazedor e figura estelar dessa grandiosa mentira, forjada da cabeça aos pés pela sua fantasia e dotada de vida e verdade não por suas semelhanças com uma realidade preexistente, mas pela força da inspiração de quem a escreve e o poder de suas palavras, pelas ciladas e sortilégios de sua arte.
Como é esse narrador? Suas características mais óbvias são a onisciência, a onipotência, a exuberância, a visibilidade, a egolatria. Sabe todas as coisas que acontecem durante o tempo do romance — os dezoito anos que vão do crepúsculo de outubro de 1815, quando o ex-forçado Jean Valjean entra na inóspita cidade de Digne, até o anoitecer de 1833 em que o mesmo Jean Valjean morre, na sua casinha da rue de l’Homme-Armé, acompanhado por Marius e Cosette, sob a luz dos candelabros do bispo Myriel —, e também sabe o que aconteceu antes — como foi a batalha de Waterloo, por exemplo, ou a história do convento da rue Picpus — e o que acontecerá depois que ela termine, os transtornos urbanísticos que Paris vai sofrer ou o momento, longínquo no futuro, em que a Ordem da Adoração Perpétua, que asilou Jean Valjean e Cosette durante cinco anos, entrará em decadência e se extinguirá.

     

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O personagem principal de Os miseráveis não é monsenhor Bienvenu, nem Jean Valjean, nem Fantine, nem Gavroche, nem Marius, nem Cosette, mas sim aquele que os conta e inventa, um narrador linguarudo que surge continuamente entre as suas criaturas e o leitor. Presença constante, arrebatadora, a cada passo ele interrompe o relato para opinar, às vezes em primeira pessoa e sob um nome que quer nos fazer acreditar é o próprio Victor Hugo, sempre em voz alta e cadenciada, para interpolar reflexões morais, associações históricas, poemas, lembranças íntimas, para criticar a sociedade e os homens em suas grandes intenções ou suas pequenas misérias, para condenar seus personagens ou elogiá-los. Volta e meia ele nos afirma que é apenas um obediente escriba de uma história anterior ao romance, real como a vida e verdadeira como a própria verdade, que precede, anula e transcende a ele, simples intermediário, mero copista do real. Que conversa fiada! Na verdade, ele é o astuto fazedor e figura estelar dessa grandiosa mentira, forjada da cabeça aos pés pela sua fantasia e dotada de vida e verdade não por suas semelhanças com uma realidade preexistente, mas pela força da inspiração de quem a escreve e o poder de suas palavras, pelas ciladas e sortilégios de sua arte.
Como é esse narrador? Suas características mais óbvias são a onisciência, a onipotência, a exuberância, a visibilidade, a egolatria. Sabe todas as coisas que acontecem durante o tempo do romance — os dezoito anos que vão do crepúsculo de outubro de 1815, quando o ex-forçado Jean Valjean entra na inóspita cidade de Digne, até o anoitecer de 1833 em que o mesmo Jean Valjean morre, na sua casinha da rue de l’Homme-Armé, acompanhado por Marius e Cosette, sob a luz dos candelabros do bispo Myriel —, e também sabe o que aconteceu antes — como foi a batalha de Waterloo, por exemplo, ou a história do convento da rue Picpus — e o que acontecerá depois que ela termine, os transtornos urbanísticos que Paris vai sofrer ou o momento, longínquo no futuro, em que a Ordem da Adoração Perpétua, que asilou Jean Valjean e Cosette durante cinco anos, entrará em decadência e se extinguirá.

     

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